quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Uma lição no dia do mestre



Amanheci com fome de palavras, que só veio a aumentar depois da reflexão que fiz sobre a dinâmica moderna dos relacionamentos. Às vezes acordo com vontade de fazer xixi e de parir palavras; na maioria das vezes, apenas fazer xixi. Hoje foi diferente. Quis os dois.

A vida é um “enter” de muitas coisas – nem sempre boas – que entram rápido demais nos costumes da gente. Por outro lado, infelizmente, a vida e suas novas dinâmicas não deixa de ser um “delete” pra qualquer coisa. Pior, pra qualquer pessoa! Há gente que trata o ser humano como “qualquer coisa” que mereça um “delete” quando preciso for. Trazendo tudo isso para os relacionamentos não é diferente. Também! Não, não posso me assustar.

“Os homens trocam de canais uns com os outros na mesma agilidade – e isto sem terem construído qualquer vínculo!”

O que não posso é concordar. Quando falo de relacionamentos me refiro a qualquer um que tenha o ser humano como agente do que chamaria ‘construção’. Somos todos construtores de relacionamentos: pais e filhos, amigos e irmãos, amantes (no sentido perdido e caído em desuso do que significa), colegas, confrades, vizinhos, etc.

Na vida com suas novas dinâmicas, onde o que prevalece é “o mais” (forte, belo, poderoso, influente, “pegador”, blá-blá-blá), “enter” e “delete” são botões indispensáveis, os quais se usam várias vezes e cada vez em menos tempo. Estou ficando velho demais, por vezes penso. Sinto falta de vínculos e afetos diante da enxurrada de meras companhias que o mundo apresenta. Sim, vivo dias em que o ser humano prefere as companhias aos vínculos. Deve ser mais fácil, não exige trabalho. É, não é apenas o controle remoto e seus botõezinhos que vieram “facilitar” a agilidade com que trocamos de canal. A vida contemporânea tem estimulado o ser humano ao mesmo comportamento entre si! Os homens trocam de canais uns com os outros na mesma agilidade – e isto sem terem construído qualquer vínculo! Quando muito, trata-se meramente de boa companhia. Casais se formam motivados pela companhia que um representa ao outro, mas, passada a surpresa inicial de se saber com quem “está”, resta o “delete”. “Sinto muito, querida, você não é tão dinâmica quanto pensava. Gosto é de mulheres que tenham papo agradável, sejam divertidas, curtam baladas, gostem do visu “super style”, trabalhem, dirijam e estejam sempre sorridentes no dia a dia”. “Não, mil perdões, mas não dá mais, querido. Quando a gente se conheceu pensava outra coisa a seu respeito. Na convivência fui ver que você não é tão positivo (?!), tão flexível e perfeito. Você fala muito de seus problemas, tá sempre cansado, muito diferente daquele cara que conheci no MSN e que me fez perder a cabeça...”. Meras companhias. Corpitchos, como canta Maria Rita no álbum “Samba Meu”. Não há mais tempo para vínculos.

“Seres humanos são como casas (...). A questão não é saber se tem ou não alicerce, mas se este é sólido ou não”

Agora é tempo de “delete” se o “enter” não for mais como “mostrava” no papo do MSN, na troca de scraps do orkut e do Myspace, nos diálogos em viva-voz pelo “Skype”. O carinha e a gatinha dos altos papos na mesinha do bar, da rave, da “pool party” e o caramba a quatro, de repente, como num passe de mágica, é o sapo no conto de “A Bela Adormecida”: ele ou ela roncam demais, não curte muito ficar em casa (ou não curte muito trabalho), só pensa naquilo (desde que aquilo não seja o que constitui investimento nos vínculos, mas qualquer coisa de agrado de um e mero esforço repetitivo para não desagradar por parte de outro), é todo(a) endividado(a) pela irresponsabilidade que lhe constitui o ser, curte putarias “oficiais” (chamando seu par para participar) e “extraoficiais” (quando o par não precisa ficar sabendo, em geral, quando viajam ou estão trabalhando), é um desastre nos seus vínculos parentais e familiares, um poço de preguiça, de individualidade latente ou de futilidade gritantes. Tudo isso, porém, com a maestria de não formar vínculos.

Seres humanos são como casas, aprendo neste dia do mestre com as lições do Mestre Jesus. A questão não é saber se tem ou não alicerce, mas se este é sólido ou não. Vai depender do que cada um está à procura. Pra uns, “corpitchos” e sorrisos. Pra outros, a mera companhia de alguém pra morar junto.

De resto, altos papos de barzinhos são apenas altos papos de barzinhos. Ótimo para aliviar o estresse do dia fatigante. Diferentemente, uma casa leva tempo pra edificar, gasta-se em investimento e preocupação com o material utilizado. O que não se pode esquecer é que o local sobre o qual será edificada (rocha ou areia?) é sobremodo importante. A dinâmica da vida moderna tem subestimado a prudência como valor no ser. Na leitura do Evangelho de São Lucas, Jesus convida à reflexão, comparando o prudente e o investidor do bem “a um homem que, edificando uma casa, cavou, abriu profunda vala e lançou o alicerce sobre a rocha; e, vindo a enchente, arrojou-se o rio contra aquela casa e não a pôde abalar, por ter sido bem construída”.

Esta é uma lição para quem não abre mão de vínculos, o que é muito diferente de investir em meras companhias. Na vida, não importa a dinâmica, todos somos alunos-aprendizes. Fica aqui minha homenagem ao Dia dos Mestres.



P.S.: Parabéns a todos os mestres que conheço, alguns dos quais como escolha profissional: Caio, Marcinho Retamero, Paulinho, Chico, Eulen, Mazinha, Madrezita, Ophelinha, Neidinha, Inho-inho, Iraydes, Leozito, Lea e Luiza, Katinha Moreno, Marcinha, além de muitos outros, tanto os de casa quanto os de qualquer casa!

Um comentário:

Anônimo disse...

Meu lindo, obrigada por me considerar mestra, acho que nunca ninguém me tratou assim e lendo este texto me emocionei quando vi meu nome (madrezita) no meio de tantos mestres que realmente trabalham nessa profissão.
Quando chegar em BH vou ter mais oportunidade de ler com calma e copiar todos que gosto para minha caixa de mensagens (farelos e silabas) que fiz no meu computador, mas aqui tá difícil porque o computador dos meninos é muito disputado, rsrsrs...
Um beijo no seu coração.
Sua mãezinha

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