segunda-feira, 31 de maio de 2010

O absurdo da liberdade, os limites do amor


Não é não. Sim é sim. Possibilidades são sempre caminhos. Aonde levam? É preciso descobrir. Descobertas se fazem enquanto se caminha. Enquanto se vive. Seres em “vegetação” ambulante não caminham, por isso não vivem. Viver é diferente de existir. Há pessoas que vivem; outras, apenas existem. Nascer, crescer, reproduzir, envelhecer e morrer. Parece simples. É apenas “uma” regra de “um” processo biológico tido padrão. Na existência há padrões estabelecidos. Na vida, nada é estabelecido a não ser por quem se lança a descobrir. Eu queria ter uma escada que me levasse, algumas vezes, para lugares acima de minhas possibilidades. Delírio. Eu não posso querer soluções mágicas. A vida tem ensinado que é preciso se lançar e voar. É voando que se perde os medos. Clarice tinha razão, é absurdamente adorável voar sem medos. E daí? É preciso fazer apenas aquilo que [me] der na telha. Às vezes, também não é preciso nada. Basta um olhar. O olhar convence o sábio de muita coisa. Nem todas as coisas precisam ser ditas. Vive-se em alto e bom som! Quem vive seguro de si aprende, mesmo sem saber, que a máxima do 1º século, devotada a São Paulo, tem toda a razão de ser: “feliz é o homem que não se condena naquilo que ele mesmo aprova!”. Liberdade é a plena certeza do que se tem e do que se quer. No entanto, liberdade também é o nome do medo de muita gente. Liberdade é subir até as nuvens e não ter medo sequer das quedas. Elas são inevitáveis pra quem sai do lugar. Sim, basta ir adiante. É na queda que a gente reaprende a ficar de pé. Isso se dá desde criancinha, seria diferente agora? Mas o barato de viver é não saber o dia de amanhã. O totalmente desconhecido é estimulante. Quem espera por algo que já se tem? E assim, de acertos e equívocos, a gente monta um castelo dentro das nossas planícies. Mas não me chamem pra me encastelar definitivamente. Nada de definitivos aqui embaixo! A vida é um gerúndio que escorre para além do possível. É bem provável que nem mesmo o texto se encerre aqui. Reflexo do meu caminhar, seguro, porém desconhecedor do que virá depois. Nem mesmo o amor é definitivo, ou seja, preso aos limites, encerrado e pronto. A morte seria um definitivo à vida? Quem disse? Eu creio é em vida sem fim. Quem acaba é espetáculo. A vida deve continuar! Se no corpo ou na memória, cada qual decida enquanto pode discernir as coisas. A vida não tem tempo a perder. Só perde tempo quem apenas existe.



Quem vive, e vive no gozo da liberdade, sobe para além das nuvens. Vai além das chuvas e dos temporais. Lá em cima o sol é constante. Ele, definitivamente, nasce para todos e todas. O “definitivo” aqui é apenas a certeza de como lá em cima as coisas são diferentes. O buraco é mais embaixo lá em cima! Lá em cima é acima do quê? De meus limites. O perfeito amor lança fora toda a proposta de limite, inclusive o medo de ser. É por isso que o amor jamais acaba. Havendo profecias, elas passarão. O amor é apenas eterno, mas até o conceito de eternidade não o encaixota. O amor é! É porque não tem tempo de durar. Quem tem tempo é quem tem amarras, portanto, não goza da total liberdade. Liberdade é o não-tempo? Não, é antes o benefício de quem não está nem um pouco aí para o que é, para o que ainda não é e para o que não é. É tal como o amor, que deveria ser o chão desta vida, mas, às vezes a gente faz de teste inconsciente dos nossos próprios limites. Mas a gente não agüenta o amor. Ele é sempre além de nós, para acima da escadinha que eu imagino e que leva para não-sei-onde, mas só sei que é acima dos meus próprios limites – os limites de minha própria consciência. Quem dera todos vivessem nos limites de suas próprias consciências! E o que passar disso? É abismo. Para nós. Não para o amor. Mas que cada um descubra isso enquanto caminha. Eu sigo o meu próprio caminho. Adiante de mim, a tal escadinha e o desconhecido amanhã. Subirei assoviando porque o melhor desta liberdade chamada vida é viver cantando esperanças. Uma delas? A de que o sol me aguarda lá em cima!




Nota de rodapé: Um texto que parece ter sido psicografado, dada a velocidade da vontade de fabricar palavras que surgiram do nada, após ter terminado um trabalho. Em dois ou três minutinhos, eis o conjunto delas – as palavras. Um sentimento de dever cumprido me toma neste momento ao saber que a inspiração desceu e, brincando, voltou a subir a tal escadinha para além das nuvens – os limites da consciência.

domingo, 30 de maio de 2010

Notinhas do ainda-acontecendo final de semana


Final de semana em pleno gerúndio, ou seja, acontecendo. Talvez por isso esteja agitado, senão vejamos. Sepultamento do pai de amigos de infância na manhã de sexta. À noite, pra despairecer, Teatro de Arena em Copacabana, assistindo ao brilhante texto do professor, filósofo e dramaturgo português Vicente Sanches na peça “África!”. Sábado ao lado de amigos numa programação de alto nível com os professores Luiz Ribeiro e Fátima Almeida, da PUC/Rio, ocasião em que conheci o ex-BBB Jean Wyllys, que, por sinal, é um ser humano carismático e inteligente. Claro, não ficam pra trás o Serginho Viula, que teve ótima participação no debate, nem o Marcinho Retamero, que conduziu tudo com brilhantismo e academicismo inigualáveis.

Entre um e outro dia neste final de semana, ainda arranjei tempo, numa tarde dessas qualquer, ao lado de uma amiga, para cumprir cabalmente minha Missão junto aos idosos de uma instituição asilar. Tudo, diga-se, movido pelo inconfundível prazer de fazer o que me faz bem. Pra mim o amor também carrega esses apelidos, o de fazer o bem sem esperar algo em troca.

Como se vê, meu final de semana até agora não teve balada, bebedeira, nem sequer sacudi o esqueleto ao som de DJ famoso algum. Se bem que, de tempos pra cá, sinto meu relógio biológico cada vez mais resoluto e carrancudo quanto à necessidade de dormir (nem que seja no início da madrugada). Por outro lado, não que todas essas coisas não sejam, de alguma forma, proveitosas (é fato que gosto não se discute, respeita-se!), mas é que a cada dia me dou mais conta que o que me faz bem acaba me lançando para outros rumos. Segui-los, torna-me mais diferente a cada dia. Diferente entre os diferentes e diferente entre os iguais. Diferença não é superioridade, é bom que se saliente pra não exacerbar pretensas vaidades.

Após o debate de ontem à noite [o que o Jean Wyllys também participou], amigos me convidaram para uma esticada numa pizzaria e, de quebra, no aconchego da madrugada, nos braços de uma balada. Recusei a ambos movido pela falta de vontade, o que não deixa de ser sintoma da liberdade que me possui. Minha vontade era a de estar em casa saboreando algumas obras, não entre paredes barulhentas e ao som de hit algum. Ando numa paixonite aguda pelos livros e, particularmente, por uma obra sobre a qual me debruço em pesquisa. Leio até o sono me convidar para ‘nossa’ cama. E assim ocorreu, literalmente. Levei-o pra cama comigo (ou vice-versa, confesso não me lembrar!). Falo do sono, o único que me corteja com êxito.

Por falar em côrte, o Viula e meu amigo chileno Jorgito ainda insistem na tese de doutorado de que estoy solo por mi própio deseo. Era o que diziam no coquetel pós-debate de ontem. Eles sabem que discordo disso. Considerando que os meses têm passado tão rapidamente [ao menos essa é a minha impressão!]; considerando que os programas noturnos que abocanham as horas típicas da madrugada não me chamam mais a atenção; considerando que algumas oportunidades surgem muito mais na “night” que ao longo do dia; considerando que sex appeal é algo que definitivamente não me pertence, creio que dificilmente alguma coisa mudará no reino da Dinamarca. Enquanto não muda, porém, segue o domingo-pé-de-cachimbo com a oportunidade vestida do momento “hoje”. E hoje é o dia pra continuar conjugando verbos no gerúndio até que o final de semana espoque na segunda-feira, aquela acerca da qual o Garfield e milhares de brasileiros não gostam muito.

Bom, tô de saía pra mais uma aulinha no projeto Betel. Domingo ainda promete... É isso, ao menos por agora. Bom domingo a todos!


quarta-feira, 26 de maio de 2010

Fazendo amor com os sons e com as palavras


Quatro paredes. Um tempo e um contratempo. O copo pela metade. A outra, em mim. Um minutinho é o atraso do meu relógio. Em segundos, já consertei. Um bom tempo é o que tive neste final de semana. Lançamento do livro de meu amigo, seu primeiro romance. Aos jardins do Palácio do Catete, lado a lado aos burburinhos do lançamento, a melodia outonal de uma roda de seresteiros. Amo serestas, embora às vezes me assalte a idéia de que o “clima” saudosista é que me contagia. Soube que aos sábados o pessoal da antiga faz encontro naqueles jardins. Do encontro, vários outros encontros com a música de boa qualidade. Se ainda não rabisquei em palavras por aqui, quem me conhece sabe que sou das antigas (ainda que não tendo vivido nesses áureos tempos).


E por falar em sons que não são tocados, os do abraço e os do tapinha nas costas são estimulantes. O som da lembrança que a memória não apaga também o é. Às vezes, até o som do pranto (e por que não?). Há outros mais estranhos, mas não perdem o destaque enquanto fabricantes de sons. A folha que rasga quando assume que era rascunho. O plac-plac dos sapatos pelos corredores famintos de ecos. O selvático tabefe na cara do filho que assume ser original, e não rascunho social. O cansaço da madrugada que rasga tal como folha até que tombe na cama. Há um sem número de sons espalhados pelas ondas que, por sua vez, são pela física conhecidas como perturbações que se propagam pelo espaço. Se perturbam, emitem qualquer ruído. E assim, fabricando e fabricando sons a gente se percebe vivos.


Há sons de ventos lá fora. Aqui dentro, calmaria. É o que importa. Tomo a outra metade do copo sem companhia. Volto ao pré-texto e me embriago de lembranças e alguns pensamentos torpes. Rasgo alguns deles como folha de papel. Vou fabricando ruídos em ondas e rascunhos. A noite tomba, mas o pensamento sobrevive à queda. Estou no melhor horário pra procriar textos. Há um clima fértil me esquentando as idéias, mas até que tudo se consuma vou de leve pelas bordas das divagações. Gosto dessas coisas, preliminares ou não, só sei que gosto. As quatro paredes são meras testemunhas silenciosas. É assim que deve ser. Somos somente eu e as palavras. Breve, se tudo der certo, após o ciclo natural da gestação, o texto. Enquanto não penetro no absurdo das palavras, levanto-me para encher só mais um copo. A noite promete...


Notinha de rodapé [convite]:

Não poderia deixar de mencionar um evento que ocorrerá no fim de semana e para o qual fui convidado. Quem estiver pelo Rio neste sábado, 29 de maio, segue aqui o convite para uma discussão interessante sobre o filme Meninos não choram. Após a exibição, os doutores em psicologia Luiz Ribeiro e Fátima Almeida, ambos da PUC/Rio, darão uma palestra seguida de debate sobre a temática envolvida no filme. O endereço do evento consta na imagem.


quarta-feira, 19 de maio de 2010

Frases soltas no ar, o simples sem complexidade

Apenas porque eu quis pensar um pouco mais. Apenas porque não sou dono das verdades, apenas a minha, e olha lá. Apenas porque parado não dá pra ficar, nem com os pés, menos ainda com o pensamento. Apenas porque eu, às vezes, me canso da anormalidade e surto como ser normal. Apenas porque a vida vale mais que as aves no céu. Apenas porque os conceitos, os dogmas e as idéias não podem ir contra a simplicidade das coisas nem contra o direito de ninguém. Apenas porque eu, às vezes, também sou sonhador e fujo dos que tornam tudo difícil. Sabe, coisas de quem insiste que ainda pode dar fé. Mas fé em alguma coisa melhor que, às vezes, nem sei se virá mesmo ou é só mais um surto de minha normalidade teimosamente pensante...









Extraídos da obra “No caminho do arco-íris”, organizado por Lea Carvalho. RJ: Editora Metanoia, 2010.

terça-feira, 18 de maio de 2010

O debate sobre o Estatuto das Famílias na CCJ da Câmara Federal


Um debate bastante polarizado dominou o clima da audiência pública sobre o Estatuto das Famílias na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) na quarta-feira passada, 12/05/2010, em Brasília, reconhecida pela cultura local como a terra dos Candangos. O Estatuto engloba diversos projetos de lei (PL 674/07 e 2285/07, entre outros) e, em alguns deles, existe a regulamentação da união entre pessoas do mesmo sexo e da adoção feita por esses casais.

Críticos e defensores da união civil de homossexuais colocaram seus argumentos diante do plenário lotado, onde evangélicos contrários à união de pessoas do mesmo sexo estavam em maioria.

Para tentar chegar a um acordo, o presidente da CCJ e relator do Estatuto das Famílias, deputado Eliseu Padilha (PMDB-RS), disse que diante de tantas diferenças e dúvidas, vai tentar encontrar um meio termo. Hã? “Meio termo”? Não me peçam pra imaginar o que poderá sair desse estatuto franksteinizado...

Para o presidente da Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais, Toni Reis, não se trata de casamento, mas sim de garantir direitos civis. "Envolve essa questão da herança, de planos de saúde, de adoção. Nós queremos nem menos nem mais, queremos direitos iguais. Nós não queremos é o casamento, nesse momento não é a nossa pretensão. O que nós queremos são os direitos civis".

Toni Reis citou declarações das organizações das Nações Unidas (ONU) e dos Estados Americanos (OEA) para defender o direito ao reconhecimento da união civil e da adoção entre pessoas do mesmo sexo. Ele destacou que o Governo Lula também apoia a reivindicação e mencionou o programa Brasil sem Homofobia, coordenado pela Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República. E argumentou ao final: "O Brasil é um Estado laico e queremos o que a Constituição preconiza, direitos civis".

O pastor da Assembleia de Deus, Silas Malafaia, questionou se outros comportamentos poderiam, futuramente, virar lei. "Então vamos liberar relações com cachorro, vamos liberar com cadáveres, isso também não é um comportamento?" O pastor foi muito aplaudido durante sua exposição. Malafaia afirmou que conceder os diretos civis é a porta para depois aprovarem o casamento. Ele defendeu que a família é o homem, a mulher e a prole, sendo que a própria Constituição defende esse desenho familiar.

Na mesma linha crítica, o pastor da Igreja Assembleia de Deus, Abner Ferreira afirmou que o Estatuto das Famílias seria, na verdade, o Estatuto da Desconstrução da Família. Segundo ele, ao admitir a união de pessoas do mesmo sexo, a proposta pretende destruir o padrão da família natural, em vez de protegê-la. Ele disse que todas as outras formas de família são incompletas e que toda manobra contrária à família natural deve ser rejeitada.

A vice-presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família, Maria Berenice Dias, afirmou que o fato de a Constituição proteger a união entre homem e mulher não significa que uniões homoafetivas também não possam ter direitos na esfera civil.

Ela avaliou que o debate foi para a esfera ideológica. "Estou sentindo nesse espaço um clima de muito medo, de muito revanchismo, pouco técnico, pouco científico, pouco preparado”, observou. “As pessoas estão se deixando dominar por posições religiosas muito ferrenhas, e confesso que não sei porque têm medo que simplesmente se assegure direitos aos homossexuais, se assegure a crianças terem um lar", acrescentou.


Maria Berenice Dias citou decisão recente do Superior Tribunal de Justiça, que reconheceu a adoção feita por duas mulheres, e afirmou que a união homoafetiva não ameaça a família. "Argentina, Uruguai, México e Canadá são alguns dos países que reconhecem essas uniões. Quem conhece esses lugares sabe que, por lá, a família vai muito bem, obrigada", disse. Aliás, diga-se, não apenas por lá, mas em pelo menos 17 países pelo mundo.

Ontem, 17 de maio, no dia mundial de combate à homofobia, o presidente de Portugal , Aníbal Cavaco Silva, anunciou em cadeia nacional a promulgação da lei que autoriza o mesmo tratamento das uniões homo às hetero. Particularmente, saltou aos olhos seu pronunciamento ao dizer que estaria deixando de lado suas “convicções pessoais” como católico praticante para pensar mais elevado em outros temas nacionais: “sinto que não deveria contribuir para prolongar inutilmente esse debate, que só serviria para aumentar as divisões entre os portugueses e tirar a atenção dos políticos dos graves problemas que nos afetam”.

No sítio da Câmara Federal [Agência Câmara de Notícias] do dia 12 de maio de 2010 é possível ver como o assunto mexe com os ânimos da fé de muitos – isso mesmo, a coisa está sendo reduzida à esfera religiosa! -, pois os comentários postados pelos internautas reproduzem o quantitativo de opiniões sob a mesma vertente ideológica. Os mais recentes comentários diziam, entre outras coisas:

“Uma coisa é respeitar o homossexual e não ter preconceitos quanto à sua opção sexual, assim como fazemos com os fumantes no tocante à opção de fumar, ninguém deve discriminá-los. Outra coisa é dizer que o fumo faz bem à saúde. Respeitar as opções não quer dizer que todas as opções sejam iguais. A opção de não fumar é melhor que a de fumar e a opção heterossexual é melhor que a homossexual”, assina Bruno.

“Definitivamente essa proposta de regulamentar a união de homossexuais é uma desonra aos preceitos da palavra de Deus para o homem e a mulher pois contraria e se opõe à santidade do nosso Deus”, assina Robervanda.

Um tal de Vanderlei foi mais tirânico, pois disse: “Vivemos na democracia. Em outras palavras, a maioria do povo governa ou decide como deve ser o governo. As minorias devem acatar o que a maioria determinar. Este é o princípio básico da democracia. Existem países que não existe a democracia. Será que lá é melhor?”.

Daí, pergunto: vivemos num país ideal no qual as pessoas são respeitadas por aquilo que são ou vivemos num país do “ainda-não” em que se é necessário lutar com as armas da cidadania plena para o respeito à dignidade da pessoa humana? Sim, pois é preciso avisar aos desavisados que homossexualidade não é “opção”, ou seja, não é escolha de ninguém em sã consciência psíquica sofrer diante de um padrão heterossexista, o ter que passar por esse achincalhe ou, para os que se curvam ao letrismo dos dogmas de natureza moral e tirânica, o padecer pela escravidão ao medo da danação eterna!


Os debates, obviamente, ainda não levaram a muitos passos dado o abismo entre as posições suscitadas. De qualquer forma, ficam aqui as implicações sobre o cenário dos fatos que se discute em nosso Parlamento. Vale a pena ficar calado e permitir que a omissão seja a chave para abrir as portas do retrocesso no campo das relações sociais e jurídicas existentes? Ou será que alguém duvida das manobras articuladas pelos segmentos fundamentalistas religiosos junto aos seus pares eleitos graças aos seus “e$forço$” eleitoreiros?

Na semana passada assistimos chocados ao acinte da malta dos perversos transfigurados em defensores da família [a família na obsolescência do entendimento deles!], comparando comportamentos qualificados como doenças ou distúrbios psíquicos pela OMS e as orientações sexuais. Sim, a disseminação do mal foi tão acintosa e certa de impunidade que ousou verborragiar a estupidez sem máscara alguma: gays e pedófilos, gays e necrófilos, gays e zoófilos foram assemelhados na cara dura diante de uma Comissão de Constituição e Justiça! A arrogância de um deles, aplaudida pela maioria ortodoxa religiosa ali presente, foi tanta que deu seu recado às lideranças partidárias, trazendo o debate para o contexto político das eleições presidenciais:

"Eu ouvi os homossexuais fazerem aqui pronunciamentos dizendo que o presidente os indicou para a ONU, que o presidente os apoia totalmente, então nós evangélicos, que representamos 25% da população, temos que pensar muito bem em quem vamos votar para presidente da República", avisou do alto de sua insolência o suposto porta-voz de ¼ do eleitorado nacional.

Que ninguém me entenda mal, tenho lá minhas convicções de ordem religiosa, as quais me inspiram à coexistência pacífica com todos os meus confrades [de todos os credos ou não], mas justamente porque amo os princípios pacificadores que são a essência da Igreja [aqui entendida não como termo com referência a qualquer institucionalização, mas apenas como categoria dos que são "chamados para fora" [1] do arbítrio dos deuses “Poder” e “Glória”], é que não engulo os ideais ensimesmados e absolutistas da "igreja evangélica". Sim, não engulo porque não reconheço nela – nem de longe, nem como sombra ou sereno – as marcas amorosas e portanto revolucionárias daquele que se diz o seu “inspirador”, conforme leio nos Evangelhos. Creio que somente quando o que está aí passar por uma desconstrução é que a Igreja terá chance de renascer no Brasil.

Entretanto, à vista daquilo a que todos assistimos na CCJ da Câmara, cabe-me a retórica da pergunta inspirada numa das letras do saudoso profeta cantador Renato Russo: "Que país é este?". Que país é este que nega direitos aos seus cidadãos, que faz do mais nobre Palácio das Leis neste solo um palco para “panem et circenses”, conforme nos inspiram os versos das Sátiras de Juvenal? Que país é este que transforma um debate sério num solilóquio moral-religioso desses “diabólós” [2] que fazem da fé uma bandeira política?

É pra se pensar, prezados cidadãos de bem e consortes amantes da democracia. Porque parado nem mesmo os modelos tradicionais de família em sociedade não ficam mais! Não me lembro neste instante, mas acho que o nome que se dá a isso é evolução natural das coisas. É, deve ser isso. Evolução natural. Na próxima audiência pública, não poderemos esquecer de levar isso para os “diabos-acusadores” quando emergirem lá no centro da terra dos Candangos.

Por ora, à lei e ao amor! Xô, Satanases [3] !


___________________________
Texto adaptado da reportagem de Daniele Lessa no sítio da Câmara Federal, “Religiosos, juristas e ongs divergem sobre união civil gay”, de 12/05/2010.

[1] Do original grego "ekklésia", ou seja, os "chamados para fora".

[2] Do original grego, “acusador” ou “acusadores”, "opositor", "o que lança através ou por intermédio de". Diabo.

[3] Do original grego, Satan, ou seja, "adversário".

domingo, 16 de maio de 2010

Algumas observâncias do “finde”...



•• Este final de semana, fazendo minhas comprinhas no supermercado [sim, sou dono de casa!], acabei passando por uma amiga que é funcionária naquele estabelecimento. Perguntei-lhe como tinha sido seu dia das mães. Respondeu-me exaltando as virtudes do maridão, o mesmo que lhe havia preparado todo o almoço em comemoração àquela data. Elogiei a atitude do camarada. A partir daí, ela foi me dizendo como o conheceu, etc e tal. Ao final, arremtatou: “- E ainda ouço alguns dizerem que não existe amor à primeira vista. Sim, existe. Assim ocorreu comigo. Conheci-o e me apaixonei por ele no instante em que o vi. Assegurei que seria meu. Estamos juntos há treze anos. E felizes, tá!”

Eu não duvido. Mas que é exceção à regra, ah, isso é!

•• Nesta noite de sábado, estive com três amigos assistindo ao musical “Era no tempo do Rei”, baseado no romance de Ruy Castro, roteiro de Heloisa Seixas e Julia Romeu. Grande elenco. Achei divertido e enriquecedor. Aplaudi efusivamente. O barato é que um amigo está no elenco, ao lado de Leo Jaime, Soraya Ravenle, Tadeu Aguiar, Alice Borges, entre outras estrelas – e nem tinha noção do fato.

Narrada pela rainha Dona Maria – que, apesar de louca, presta atenção em tudo o que acontece à sua volta, - a comédia musical está recheada de paixões proibidas, seduções e intrigas, perseguições e ciúme. Sem falar nas risadas.

Um excelente programa para quem está no Rio de Janeiro.

•• Nesta segunda-feira, 17 de maio, às 20h, no dia mundial de combate à homofobia, minha amiga querida e mais-que-amada Lea Carvalho, que me honra em ser assídua nos meus estudos e palestras, lançará a obra “No caminho do arco-íris”. A proposta é discutir as questões ligadas à diversidade ou, como a autora pondera, "tocar os corações e as mentes para que se possa apreciar e acolher a experiência humana em todas as suas cores e matizes, a fim de fazermos parte de algo realmente grande: a construção de um paradigma social totalmente inclusivo, justo e solidário". Tive a honra de escrever algumas palavrinhas em forma de depoimento na obra.

O lançamento será virtual e, de quebra, todos poderão assisti-la numa teleconferência com o tema “Direitos Sexuais são Direitos Humanos”.

Aos interessados em assisti-la no lançamento virtual - que, sei, será de grande valia! - bastará enviar um e-mail para faleconosco@metanoiaeditora.com

•• Por falar em homofobia, hoje às 15h, em Ipanema, haverá uma marcha contra a intolerância com a participação de diversos organismos da sociedade civil, entre os quais a própria autora da obra e outros grandes amigos. Só não estarei presente em razão de um estudo que darei sobre o tema lá em Botafogo no mesmo período. Logo abaixo segue uma imagem da campanha “Homofobia é abominação” promovida pelos queridos do projeto Betel aqui no Rio de Janeiro.


terça-feira, 11 de maio de 2010

A maio o que é de maio!


Maio atravessa o calendário sem nos fazer alarde. Corre maroto. Sapeca que só, quase alcança o meio do mês. Sorri, dá uns passos pra trás. Sabe que é apenas o quinto dos meses no ano. Brinca, volta pra frente. Pula de dez para onze dias corridos assim que ultrapassa a meia-noite. Hoje são onze, mas ainda há caminho de mais três semanas pela frente.

Num certo sentido bem familiar, maio é um mês com diversas lembranças esculpidas pelas datas natalícias. Ao menos, para minha família. Um dos sobrinhos, festejou aniversário dia quatro. Irmão, dia cinco. Mãe, dia oito. Tia, festejará oitenta no dia doze. Maio é bem peculiar mesmo.

É o mês das noivas para um monte de gente. Mês de todas as mães, as do ventre e as feitas pelos laços profundos do coração. Mês da família, alguns insistem. E quanto aos outros meses? Bom, deixemos pra lá. Maio é o mês dos trabalhadores. É o mês de heróis e heroínas. De Joana D’Arc, capturada pelos franceses e entregue aos ingleses durante a Guerra dos Cem Anos à Ayrton Senna, morto durante o Grande Prêmio de San Marino. O mês tem também cores fortes em nossa História, como a negra. Foi aos treze do mês que, ao menos oficialmente, abolimos a escravatura neste país. Abolimos mesmo? Bom, deixemos por ora. Maio também foi palco de um célebre julgamento, o de Oscar Wilde no início do século passado, condenado aos vinte e sete deste mês à pena de dois anos de prisão pelo crime de “sodomia”. Apesar da enorme crítica da classe literária à época, o famoso escritor inglês teve que cumprir a pena, imposta apenas porque fruto das convenções vitorianas da época.

Maio também é o mês da luta mundial contra a homofobia, especificamente no dia dezessete. A data foi escolhida lembrando da tiragem da homossexualidade da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID) da Organização Mundial de Saúde, fato ocorrido em 1990. Se inspirado na data ou não, este é o mês dos lançamentos dos livros escritos por dois queridos amigos: “Proibido Amor” e “No caminho do arco-íris”, de Davy Alberto Rodrigues e Léa Carvalho, respectivamente.

Recentemente criado, maio também celebra aos vinte e cinco o dia nacional da adoção. E penso que muitos outros fatos já aconteceram e ainda acontecerão neste mês. Eu mesmo me sinto retornando, de certa forma, às atividades blogueiras. Fiquei duas semanas mergulhado na defesa de um julgamento, coisa de uma outra missão, diria profética, que desempenho profissionalmente.

Enfim, maio está apenas no início. Eu ando ultimamente me sentindo assim, no início. [Re]começando. A obra “Os Lusíadas”, de Camões, utiliza o “ab initio” para transformá-la “in media res”, ou seja, a técnica para começar pelo meio, e não necessariamente pelo início. Talvez tenha começado pelo meio. Talvez por isso me sinta agora no início. Há tanta coisa nova pra mim, mesmo depois dos trintinha! (risos). Bem, são meus talvezes que dialogam comigo. De talvez em talvez, certo mesmo é meu desejo de querer um final feliz ou, quem sabe, um feliz-acontecendo-sempre. Pra mim e para os mais caros. Neste e nos outros meses também.

Longe de mim ser demagogo, mas eu tenho procurado me esmerar!...


* * *

Nota de rodapé: segue logo abaixo, mais uma vez, o apelo para aqueles que desejarem doar leite integral (em pó) para as crianças soropositivas da Casa Maria de Magdala, localizada em Niterói (RJ). Aos que estiverem distantes mas quiserem ajudar, a sugestão é acessar o site da instituição filantrópica e procurar saber como doar amor.



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