sexta-feira, 29 de fevereiro de 2008

'50-tinha' pra Bossa Nova


Como diria Tom Jobim, “bossa nova é folia controlada”. E será neste clima que os bossanovistas iremos comemorar o aniversário da cidade do Rio de Janeiro e os 50 anos de bossa nova neste sábado, 1º de março. Curioso notar que o início da bossa, por assim dizer, se deu a partir de uma canção "Chega de Saudades". Letra de Tom e Vinicius, é considerado o marco inicial da Bossa Nova, e completa os seus cinqüentinhas de composição. Pra comemorar em grande estilo, show na Praia de Ipanema, berço de muita coisa, não apenas da “girl from Ipanema”. Ipanema é algo mágico, uma sunset boulevard dos trópicos com os melhores pores-de-sol que já vi. Local de encontros e inspirações de Vinícius, Tom, Roberto, Wanda, Oscar Castro, João Donato, Leny Andrade, Joyce, tantos e tantos outros. Faço planos de ir conferir, cantar baixinho, ouvir violão em tom suave e etcétera. Às 19h. Vamos? [Saiba +]

Imagem: "Expositor", por Ian Rangel.

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2008

Coisas pra gostar

"Viabilidades". By Cardo. All rights reserved

01. Gosto é de gente. Abraços, sorrisos, a bem-querência e todas as feições que puder ver olho a olho. Gosto tanto de gente que passei mais de 10 anos de minha vida atuando paralelamente em ONGs e Associações que reivindicam direitos e exercício da cidadania nas mais diferentes áreas sociais. Pastoral da Criança, Associação de Moradores, Projeto Farmácia Comunitária, Projeto Médicos Voluntários, Núcleo Comunitário de Direitos do Consumidor, Assistência Jurídica a Colônias de Pescadores, Biblioteca, Pré-vestibular comunitário, etc e tal.

02. Gosto de devorar livros e saberes. Gosto de ensinar a pensar. Fazia isso desde os idos de catequista. Cada um tem seu modo de pensar. Pra que formatarmos o pensamento?

03. Ainda acredito na bondade da alma humana. Sei que os “luzeiros” estão acesos pelas ruas e esquinas da vida. Basta ter olhos pra vê-los. Quando fecho meus olhos, abro muitos outros poesia a fora. Quem disse que a vida é somente prosa?

04. Amo a natureza. Passeio pelos recantos da cidade. O Rio é tão privilegiado! A Urca, as pedras do Arpoador, o calçadão de Copa, o Caminho Cláudio Coutinho, o Forte do Leme, o friozinho do clima ameno no Jardim Botânico, nas Paineiras, na Gávea. O Centro Histórico. A Quinta da Boa Vista. Os museus, os centros culturais, tudo o que tem ar de cultura. Bom pra se ir. Bom pra se fotografar. E por aí vai...

05. A boa companhia. Tenha o nome que for. Eu me perco em boas companhias. Tem vezes que é melhor até esquecer o caminho de volta...

Coisas, apenas coisas, que não curto

"Sem conteúdo". By Cardo. All rights reserved

01. O medo, a pressão, a fala negativa nos discursos feitos e também ouvidos. Como faz bem ser feliz! Como perde quem não faz do bem sua força motriz!

02. Gente coisificada. Um "isso". Alguma coisa que se esvai, se perde. Empobrece pra ser apenas - comerciavelmente - “prazer”, “aparência”, "incoerência". Quando muito, apenas um sufixo: “desejável”, “cobiçável”. Que morfema lamentável! Isso pra mim é que é inumano! E alguns seguem o fluxo sem nem se aperceber...

03. Balas de café. Chá com açúcar. Acordar cedo. Fofoca. Noitadas e suas variantes pela “night” afora... Me desculpem, é que meus dias são melhores servidos ao sol.

04. Verdades impostas. Mentiras. Gírias de gueto. Roupas extravagantes. Brincos. Trincos. Fumaça de cigarro. O próprio cigarro. Desrespeito a mim, a ti, a quem for.

05. A superficialidade. A falta de compromisso. O “desromance”. O pagar com a mesma moeda. A falta de atitude. Nossa, sou atípico!

Coisas pra cansar


Hoje é quarta-feira. Lápis apontados. Há muito tempo não usava lápis. Rabiscos soltos. Idéias voláteis. Idéias fixas. Idéias-pensamentos. Pensamentos-idéias. Lendo e relendo “scraps”, esses tais recadinhos cuja variante no inglês invade o nosso bom português-salve-salve! Muita coisa acerca da qual já avisei. Respostas clicadas no “enviar recado”. Um saco ser repetitivo! Por essas e outras que decidi [de novo?] sair do tal orkut. É, devo estar velho demais. Minha paciência vira produto escasso. Pra que a gente tem orkut? Peraí, deixa eu refazer a pergunta: pra que eu tenho orkut? O programa tem suas próprias respostas. Vejamos: contato profissional, namoro, amizade, blá blá blá. Então, o que eu procuro por lá? Não sei. Antes, curiosidade. Idos de 2004. Alguns “amigos” sendo adicionados. Gente aparentemente interessante. Gente aparentemente com gostos em comum. Gente aparentemente... Aparente é o que aparenta, assegura um dos seus conceitos na gramática. A virtualidade é isso. Tudo aparentemente por detrás do monitor do PC. Vai-se aceitando. Vai-se adicionando. Vai-se aumentando o círculo de amizades. Círculo? Que círculo? Não nos vemos. Não nos encontramos. Não tanta-coisa! E todas elas me cansam.

“Como é bom ver tanta gente bem em volta da minha vida...” – canta o Ira! Dessas coisas é que não me canso.

Que canção você é?

Quando era moleque e assistia a desenhos animados (queria de volta o tempo pra isso!), me intrigava uma pergunta que era célebre nos episódios de amnésia. Não importava a cena. Se houvesse amnésia lá vinha ela, a tal perguntinha: “Quem sou eu?”. Aliás, vinha quase sempre com outra não menos conhecida. “Onde estou?”. Parece bobagem, mas a pergunta é pertinente para qualquer um de nós. Acho que todos, alguma vez na vida, deveriam se fazer esta pergunta: quem sou eu? O lance é que muita gente não sabe quem é. São vários os fatores pra que isso ocorra. Nada de detalhes. O processo de “desindividuação” acontece quase sempre a partir do estado de consciência. É quando neguinho vai deixando de ser ingênuo, vai crescendo, deixando de lado a primeira infância.

Pensava rapidamente sobre isso enquanto relembrava algumas obras que li. Mario de Andrade dizia que era trezentos, "trezentos-e-cincoenta, mas que um dia afinal se toparia consigo mesmo. O processo de auto-conhecimento é gozado. A gente faz uma viagem alucinante por uma vida toda pra perceber que as maiores raízes em nós estavam na simplicidade dos anos, das coisas, da vida. Muita gente vai concordar comigo quando traduz o que viveu como uma trilha sonora. Que canção poderia expressar nossa mais profunda raiz? Qual canção afinal somos nós? “É preciso saber viver?”, “Como nossos pais?” Não me diga que alguém aqui ousará dizer “Yellow brick road”! A minha canção não é propriamente uma canção concreta, fixa, com identificação. É apenas uma canção. Sons, notas e lembranças da infância. São os sons combinados de briga de pardais me acordando. Sons das maritacas no abacateiro da dona Melita, minha vizinha portuguesa. Sons das canções que minha mãe inventava pra eu adormecer. Sons dos remos das canoas nas águas do cais, bem aqui na antiga Colônia de Pescadores Z-5. Sons dos temporais de granizo nos telhados de zinco da saudosa dona Melinha. Sons dos ventos nas árvores da Escola Comandante Armando Pinna. Foi lá que estudei dos 6 aos 9 anos de idade. Acredito que a combinação deles todos daria minha canção...

Sabe o que tô lendo neste momento? Anotações de uma agenda de 1993. Juro pra vocês que não guardo todas as agendas! (rs...) Falta de espaço. As mais anotadas eu guardei sim. A de 1993 se encaixa neste perfil. E tá registrado em julho um trecho de uma obra que li na época. Velho hábito. Coincidência ou não, estão lá as palavras da velhinha que amei sem conhecer. Catherine Doherty de Hueck, uma poetisa russa e que morou no Canadá por anos a fio. Quem é ligado a movimentos católicos deve conhecê-la por suas obras ou palestras. Sempre achei-lhe muito louca. No bom sentido, diria. De tão louca, profundamente humana. Uma graça! E são exatamente dela as anotações que registrei há 15 anos da obra “Alma da minha vida”: “eu sou uma canção solta no espaço, tão solta que o vento apanha e leva a grande altura! Mesmo que ande no chão, filha da terra, fechada nesta carne do meu corpo, eu sou canção sugada pelo vento e colhida por Deus, na eternidade.” Ela guardou os melhores sons pra se auto-definir. Se fez canção solta ao vento. Isso é que é raiz profunda! Isso é que é um “eu sei quem sou” com tons de encantamento. Boa resposta a de Catherine! E você, que canção te descreve?

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

E o Oscar vai para "Freeheld"


Acabo de acompanhar a entrega da 80ª edição do Oscar. Entre surpresas e alguns indícios confirmados (em direito criminal chamamos provas), um vencedor me chama a atenção. Não se trata de nenhum filme comerciável. Aliás, não é filme. É curta-documentário. Sou fã de documentários. “Freeheld: The Laurel Hester Story”. Dirigido por Cynthia Wade, o filme foi vencedor na categoria de Melhor Documentário de Curta-metragem. A narrativa se desenvolve contando a história dos últimos meses de vida da policial Laurel Hester e da luta que travou para a sua companheira, Stacie Andree, ter direito à pensão depois da sua morte.

Há dois meses atrás fui procurado por um senhor com drama quase parecido. A diferença era o fato que seu companheiro já tinha falecido. A pensão por morte foi negada, a despeito dos mais de quinze anos de união. Detalhes que não poderia revelar (ética profissional) lhe impediu o recebimento do benefício previdenciário. Semanas se passaram. Nas idas e vindas daquele cliente fui obtendo um caramanchão de informações que me fizeram pensar e repensar não apenas nossa cultura como também minha própria humanidade. Sim, antes de qualquer profissional há um ser humano (ou deveria havê-lo). Resolvi ajudá-lo. O caso está em estudo. A par disso, uma realidade. Eis mais uma história envolvendo vidas e patrimônio adquirido em comum. Falei vidas sim. Há mais força no termo. A palavra é sexualmente mais embaixo. Laurel, Stacie, Zés e Marias da vida é que mereciam prêmios. Pergunte a eles quais! E ainda tem gente que confunde cultura e moral com Justiça. O pior é que não é só aqui. “Freeheld”, ainda que enlatadinho dos EUA, confirma o que acabo de dizer. Não vejo a hora de assisti-lo.

Enquanto não chega ao Brasil, fica aqui uma palhinha neste vídeo do Youtube:

sábado, 23 de fevereiro de 2008

O amor, uma antiga lição e uma certeza


Acordo tem a ver com “a-core”, ou seja, de coração. Acordar é por o coração no que vier a fazer. É por legitimidade. É certeza de que levarei a sério. Seja o que for. Faça o que vier a fazer. A recíproca, por sua vez, também é verdadeira. Não há acordos solitários. Mas penso existir acordo silencioso de mim comigo mesmo. Por exemplo, já fiz acordos bem intencionados comigo mesmo pra não duvidar de minhas certezas. Decidi, por minha iniciativa, investir mais em mim mesmo.

Sei, contudo, que existem acordos que urgem pelo outro ao meu lado. Quem estará ao meu lado? “Quem é o meu próximo?”. Velha pergunta lá das salas de aula de catecismo. Jesus respondeu contando uma parábola. A do bom samaritano. O título já carrega em si sinais de radicalidade sócio-histórico-existencial. Samaritanos naquela época eram os putos da sociedade, os “misturados” com outras crenças tidas impuras pelo grupo dominante, os que se auto-intitulavam puros. Na história, o bom era o “impuro”. Que ironia! O amor é sinalizado como sentimento sem fronteiras. Sejam quais forem. Daí me vieram à mente algumas certezas. O amor não respeita nossos limites de pensar, crer e gostar. Ele é amor independente de nós. Amor existe a par de nós. A recíproca não é verdadeira. Ninguém existe sem o amor. Vegeta-se. É muito diferente. O amor é simples. Nós é que nem sempre o entendemos (ou aceitamos). Em geral, queremos amor. Por que “em geral”? Porque nem todos o tem a si mesmos. Amor-próprio. Nem todos o tem aos outros. Amor solidário. Mas isso é um outro assunto. O samaritano foi o agente de bondade naquela velha história religiosa. Rubem Alves, na obra Perguntaram-me se acredito em Deus, sabiamente nos leva a uma viagem de contexto histórico-literário. Ele reconta a mesma história como “O travesti e os religiosos”. O amor não usa passaportes. Desconhece quaisquer fronteiras. Ele é apátrida. Gostemos ou não. Neste caso, não há acordos. Amor é pra quem põe coração à obra. Uma construção, uma reforma, uma demolição. Tudo é obra. O amor é mais ou menos isso. Às vezes nos construímos, nos reformamos e nos desmontamos para construir novamente. Nunca é tarde para acordar. A-[CORE]-dar. Esta é uma das minhas certezas.

Nunca pare de amar


Se eu parar, me avise a hora do sepultamento. Quero me ver partindo bem bonito pra Pasárgada [*]. Se eu parar de amar não quero me preocupar sequer com o epitáfio. Só não deixe de me avisar. Eu peço. Pasárgada me aguarda com seus campos míticos. Do além mandarei flores e um bilhete pra que não faça o mesmo. O lugar ideal pra amar é sempre onde estamos inteiros...

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[*]Pasárgada foi capital da Pérsia, hoje Irã. Para os persas era o lugar sagrado, a terra ideal para se viver. Manuel Bandeira, em seu famoso poema "Vou-me embora pra Pasárgada" usa a mesma palavra Pasárgada para indicar um lugar ideal.

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2008

Queridos diálogos

Bia: - "Eu nunca fui alvo do amor de ninguém..."
Lúcia e Ivan: - "A gente te ama."
Bia: - "Ah, mas não tô falando de amizade."
Bia: "Falo é de amor. É diferente. Amor 'homem-mulher', entende? Nunca fui alvo de um amor assim..."

Lúcia: - "Quem foi que te disse que não?"
Ivan: - "A gente nunca sabe..."
Bia: - "Ah, eu não seria tão distraída!"
Lúcia: - "A gente é muito distraído pra tudo o que tá fora de contexto..."
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Cena com as personagens Lúcia, Bia e Ivan.
"Queridos Amigos". Episódio de 21/02/2008

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008

Confissões típicas-de-mim - Parte I



Nunca gostei de andar de bicicleta. Preferia correr, cair e ralar os joelhos com as próprias pernas. Nunca as emprestadas por rodas. Nunca morri afogado. Pudera, nunca aprendi a nadar. Nunca comprei revista de sacanagem. “Li-as” (?) emprestadas dos amigos. Nunca matei ninguém. Não digo o mesmo acerca das minhas palavras. Calminha aí, pedi desculpas. Aos que me interessavam pedi-las, óbvio! Nunca freqüentei boate. Nem preciso. O som é ensurdecedor. Pega a gente na rua, nos força à freqüência na marra. Quero distância! Nunca curti certas expressões, tipo “colé, cumpadi?” (considero boçal). “Tô na pista! Se joga!” (permanece a boçalidade). Nunca tive patins, autorama nem trenzinhos como brinquedo. Pedia jogos de estratégia e livros. Eu recebia esses últimos; meus irmãos, os primeiros (jogava do mesmo jeito!). Nunca acreditei em papai Noel, mas até os 12 anos jurava que vampiros poderiam aparecer! Nunca me embriaguei, mas já levei amigos bêbados pra casa. A deles, não a minha! Nunca entrei num motel, bordel ou pinel. Ainda mato a curiosidade! Nunca quebrei braços ou pernas. Autografava o gesso dos outros, mas - evidentemente - sem vice-versa. Nunca “fiz as unhas”. Corto-as apenas. Nunca pintei os fios de cabelo (não vejo a hora de ficarem charmosamente grisalhos).


Nunca malhei numa academia. Só na rua, e, ainda assim, na maioria das vezes, a Judas quando criança (e alguns poucos que valeram à pena!). Nunca bebi caipirinha ou whisky. Confesso que água de côco e suco de manga me dão maior prazer. Nunca me filiei a partido político. Estou convicto de meu engajamento político no dia-a-dia. Nunca seria ateu tanto quanto nunca deixaria de amar a Deus (religião não tem nada a ver com isso, que ela permaneça no canto dela e eu quietinho no meu). Nunca fiz "aquele passeio", por mais que muitos passeios tenha feito! Sei que estou me devendo há 30 anos (eu chego lá!). Nunca fui fã de carteirinha dos extremos meteorológicos, portanto, calor e frio excessivos: não! Nunca cheguei muito cedo num compromisso (só quando pensei que já estava atrasado há horas). Nunca assisti a uma partida no Maracanã (mas já o fiz no Mineirão e no São Januário pra ver meu Vascão). Nunca acampei em lugar algum (apenas no quarto de hotel). Nunca subi no Pão de Açúcar (desisti na entrada por duas vezes!), preferi a vista do Morro do Corcovado. Nunca andei de avião (pra que se eu sei como chegar na rodoviária?). Nunca voaria de asa delta, pularia de "bungee jump" ou subiria numa montanha-russa. Teria alguma coisa a ver com a altura? Alguma coisa me diz - em negrito - que sim...

Nunca fui desses que vão atrás de multidão ou de qualquer "Maria" por aí. Nunca torceria para o Flamengo, nem que fosse o último time de futebol do mundo. Nunca me calaria diante de uma injustiça próxima de mim, ainda que sofresse as conseqüências do ato. Nunca me negaria à chance de ser feliz se, de fato, valesse a pena. Nunca conjugaria o verbo "ficar", por mais que esteja em voga no "commom sense" quando o assunto é "fast love". Meu negócio sempre foi semear, germinar, crescer junto pra florescer junto. Isto demanda tempo e investimento, o que não me faltam. Ainda não vivi um grande amor. Mas quanto a isso nunca é tarde. Ponha este nunca na lista!

O que nos torna felizes


Entre mortes e feridas nem todos se salvam. Os mortos e feridos pelas ruas das grandes cidades me comprovam fatos. Uns são alvejados por balas “perdidas” mas achadas em quem por elas é atingido. Uns são poupados apenas porque não lhes chegou a vez. A boa sete não encaçapou. É questão de tempo, o tempo dos outros. O nosso tempo vai sendo costurado pela insegurança do momento seguinte. O que será que será, dizem os versos de Chico Buarque. Pensava a questão da segurança pública quando resolvi parir palavras por aqui. Conheço muita gente que sobe e desce morros nessa cidade. Todos os dias num vai-e-vem necessário. Eles sentem medo, nem sempre sabem se voltam. Mas seguem. De repente, pensei a questão da segurança interior. Somos fabricados com extrema delicadeza pelo Criador. Temos componentes interessantíssimos contra tanta coisa. A dor é um deles. A fome, mais outro. E o que falar da segurança interior?

Há tempo passou na Tv um comercial do Pão de Açúcar narrado pela poesia de Arnaldo Antunes. “O que faz você feliz?”, perguntava o próprio Arnaldo. O conjunto de palavras era de uma simplicidade daquelas que a gente só vê nos pores-de-sol de verão. Lindas. Os ecos daqueles raios de por-de-sol invadem meu parágrafo-instante e me atingem numa manhã londrinamente carioca. O que é que nos torna felizes?

“Feliz é o homem que não se condena naquilo que aprova”, dizia Paulo, o apóstolo. Sábia decisão. O problema é que alguns nem sabem quem são ou por que vivem, como então saber aquilo a cujo respeito não se condenaria ao aprovar? Cada um sabe de sua própria história. É a hora. Felicidade é segurança interna. Ela é “in” pra se tornar “ex”-terna quando é tanta que não se contém. Vaza pelos olhos. Escorre fácil no sorriso. Felicidade é um pão desfarelado! Ser feliz é mais um daqueles componentes que todos temos. Nem todos sabemos. Fato é que temos. Há muita insegurança a nossa volta? Verdade. Há insegurança gestada dentro de nós? Quase sempre há (mesmo que não confessemos). Eu 'kiko'? Eu insisto em viver. É a teimosia de uma fé nos meus sonhos. É a pulsão que me faz querer ser feliz. Isto é que me alia àquelas gentes que sobem e descem os morros. Nem percebo, mas faço isso todos os dias. E sempre volto.

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

Coisas em que não acredito


  • Em muitas coisas, sobretudo as que vivem de aparências. O pior mundo é o do “não-ser”. Há muitos ambientes que se revelam assim. Quanto mais ortodoxo for o ambiente na busca da “perfeição” ou da “moral” mais se perceberá o latejo de um ambiente adoecido. Lá, o “incomum” será imediatamente taxado de “imperfeito”. E assim, doenças se sucederão na maioria das vezes disfarçadas de “ortodoxia”.
  • No ser humano “coisificado”, pois se des-significou ao não valorizar o essencial. Assistimos ao levante do império dos “ismos” nestes dias. Como em toda batalha, há muitos mortos-vivos e feridos-nas-emoções caminhando por aí, esbarrando-se pelas esquinas da vida. Os sãos são os simples de alma, ainda que ricos e poderosos. Os sãos são aqueles que fazem de sua vida um caminho existencial seguro e protegido da instigante adesão aos “modismos”.
  • No mundo da religião e nos seus instrumentos de poder e controle. Deus que se deixa caber na religião (ou em qualquer outro espaço-ambiente) deixou de ser divindade para ser objeto de manipulação. Uma “doutrina” pode muito bem protagonizar o que digo. Penso em Deus como o Ser mais absolutamente livre que existe. Ele não está. Ele é! E penso que seus filhos, todos eles, sabem o bem que tal liberdade produz para a alma dos que confiam Nele.
  • Na vida monocromática dentro da qual cabem apenas o previsível, o “igual a toda a gente” e o “normal”. Meu maior estímulo para o que penso acerca disso tem a ver com os ensinos de Jesus. Ele que esclareceu a multiformidade dos seres na vida, mostrando que tudo é plural, é “multi”, infelizmente não é compreendido. Criaram um “outro ensino” em que se diz o que ele não disse. A vida, segundo ensinos Dele, é multicolorida. Todas as cores são cores de vida. E em todo rastro de vida há a certeza do AMOR DO PAI, seja o ser diferente, estranho ou bizarro.

terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

Lances do olhar...


“O bom olhar espera sempre que o que parece ser, seja para o bem, e não para o mal. O bom olhar não tem medo das conseqüências de nada. Quem tem olho bom não precisa fazer propaganda de si mesmo, pois todo o seu corpo será luminoso!”

(Caio Fábio)


“eu
quando olho nos olhos
sei quando uma pessoa
está por dentro
ou está por fora
quem está por fora
não segura
um olhar que demora
de dentro de meu centro
este poema me olha”

(Paulo Leminski)

Sobre meu pensar - I


Não espere que utilize a net pra paquerar. Não espere que elogie alguém na net pela beleza física, salvo se me pedirem opinião num papo sério e descompromissado. E isto, diga-se, sabendo-me péssimo na arte do elogio físico. Não ofereço MSN quando sinto “odor de açougueiros” no ar. Não troco número de telefones, a não ser com amigos de longa caminhada e clientes. Não trago qualquer expectativa quanto a quem quer que seja pela net (sei o quanto isto custa em desesperança e dor). Não ofereço tesouros aos devoradores do ser. Não comungo de “culturas” ou “subculturas” da superficialidade, dos encontros casuais e nem mergulho em regiões abissais ainda piores que estas (bons entendedores captam palavra por apenas uma letra!). Sou um homem com raízes, o que vale dizer sentimentos sinceros. Não sou um punhado de folhas secas e levadas por qualquer vento. Porém, nos meus sulcos correm sangue com respeito. É disto que meus frutos crescem.

Vai um coxão, aí?


Dia desses visitava no orkut alguns perfis, a maior parte de amigos de amigos. Na conclusão do que vi tinha decidido postar alguma coisa sobre a tendência contemporânea que estes programas provocam em algumas mentezinhas: a exposição voyeurista de corpos como passaporte para a amizade virtual.

Triste se não fosse verdade, mas nos tornamos cada vez mais consumidores de um grande açougue ou verdadeiros açougueiros da Idade Média. Corpos deixaram de ser parte de um todo para serem o todo-em-si. Vendem-nos como bifes de alcatra, acém, contra-filé, peito, maminha, coxa, tanquinho, bundas, etc. Isso quando não mostram outras partes apelativamente. Tudo porque há consumidores famintos da cultura do nada e que dão tudo – literalmente, dão! – ao vender/comprar esses cortes de carne. Em seguida, postam “tem MSN? O meu é...”. Isso quando não resolvem deixar mensagens e scraps típicos de seres-objeto, elogiando as peças que mais chamaram a atenção na vitrine do açougue. Entre tantas perguntas que poderia fazer, me questiono aonde vamos com tudo isso?

Longe de ser uma crítica moralista [atire a primeira pedra quem não aprecia, a seu modo, um bom “corte de carne”!], me enputeço apenas com as visitas inesperadas desses perfis no meu orkut e, pior, com os pedidos pra adicionar na lista de amigos. Eis o cúmulo: as carnes agora saem por detrás das vitrines do açougue e surgem na porta de sua casa oferecendo a si mesmas! “Quer assistir ao vídeo da Cicarelli gemendo na cama? Me add!”, “Putaria no BBB, clique aqui”, “Gatinho, você é uma delícia! A fim de uma real? Tem MSN?”, etcétera e tal...

É cada uma! Confesso aos desavisados que, se precisasse, iria pessoalmente comprar! O que eu procuro há na vitrine de uma das letras do Frejat! E, certamente, não se trata de açougue!

Obs.: All rights reserved para a imagem captada por Breno César.

Yes! Good news!

Por que Deus criou a sua imagem
foi assim o que me ensinaram
e como Deus é amor
e não comete erros
você deve ser exatamente como Ele pretendia que você fosse
isso vale para todas as pessoas
todos os planetas
todas as montanhas
todos os grãos de areias
todas as músicas
todas as lágrimas

somos todos dele
Ele ama a todos nós



(Do seriado “Queer as folk”)

Eis uma boa notícia aos desavisados de plantão! Eis uma manchete simples porém forte o suficiente pra livrar a muitos de infernos-no-ser. Chamem "evangelho” (“boas novas”, literalmente) porque é!

O crescer e o pensar em meio às marés


Cresci numa colônia de pescadores encravada na baía de Guanabara, bem no ponto onde vieram a construir a Ponte Rio-Niterói na década de 70. Quando moleque me esbaldei. Tive a companhia de elementos lúdicos e me assustei com a visceralidade vagabunda dos meus colegas de rua. Trepei em árvore, roubei fruta, pulei de muro ao fugir de cachorro bravo, tocava a campainha e corria, pulava sobre os barcos, prendia pé nas redes, fugia da ira dos donos dos barcos, suava por todos os poros pedindo mais liberdade, brigava e apanhava, chegava em tarde tarde, levava bronca e surra, muitas vezes, até dos irmãos mais velhos. Sou o do meio. Até os 14 anos não era apaixonado pelos estudos, mas o fazia por não me ter escolha inteligente. Era isso ou porrada (rs...). Após sim é que passei a me aventurar nessa paixão. Não larguei mais. Tinha orgulho – às vezes até prepotente – em ser um dos mais dedicados alunos. Entrei pra Universidade Federal do Rio de Janeiro com excelentes notas. E lá dentro não fugi à (minha) própria regra.

Naqueles idos já era catequista aos finais de semana. Foram tantos anos dedicados – e tão dedicados – que deixei de aproveitar muita coisa que qualquer rapaz sadiamente urbano viveria. Nunca entrei em boate. Nunca fiquei bêbado. E segue uma lista interessante...

Sempre fui questionador. Paradoxalmente, porém, não questionava quase nada do “campo da fé”. Isso não me fazia bem. Não questionava. Um dia qualquer me deparei com as palavras de São Paulo, o apóstolo intelectualizado, instigando seus ouvintes a uma mente ativa e participativa no processo de captação do que cria. Dizia ele: “observai todas as coisas e retende o que for bom”. Numa outra oportunidade parecia me esganar a quietude e eriçar todos os levantes do pensar com o seu “transformai-vos pela renovação da vossa mente”. Filosoficamente suas dicas permeavam as variantes do pensar “observação” e do pensar “transformação”. É na observação que se questiona e é na transformação que se usufrui do exercício questionador. Muito distante de me levar a escapar da fé acabei me aproximando. Fé pensante. Fé com gratidão pela liberdade de questionar e crer. Não parei mais. De questionar, você pode perguntar. Também. Refiro-me a amar Deus questionando todas as coisas. O barato de tudo é saber que Seu prazer é justamente me ver “ser-sendo” enquanto me transformo Nele a cada pensar.

O que sou hoje? Um ser consciente de mim, que sabe quem é, que caminha feliz na estrada-vida e que faz de todas as coisas escolhas diárias. O “observar” está em todas as coisas e o “transformar” está em mim. Meu problema questionador nunca foi com Deus, mas sim com seus supostos “donos”. Que fique claro. Não é papo de pescador, mas de alguém que conhece um pouco da alma dos homens do mar. Afinal, nasci e cresci em meio às vagas e as marés.

Neste verão algumas coisas me fazem bem, já outras...


Neste verão algumas coisas não me dão prazer. Quer exemplo? Falar a mesma coisa todos os dias é parte do que to sentindo. Como me cansa a percepção de que ta cheio de gente doida por aí, adoecida nas emoções e fingindo “vender saúde”. Teve um dia que ouvi o diálogo de duas amigas no metrô. Sentadas ao meu lado, divagavam sobre a existência. Uma delas, quase na hora de saltar, decreta: Você precisa entender que tem doido e tem perturbado. O mundo ta cheio de doido, mas tem muito mais é gente perturbada solta por aí”. Sorri discretamente com a objetividade. Intimamente concordei com a possibilidade. Fiz uma viagem introspectiva no meu pensar e me questionei acerca dos muitos que conheço, na maioria cristãos, pra concluir que vivemos uma época de profetas urbanos. Eu tinha acabado de ouvir uma no metrô.

Muitos não entenderão nada, mas meu engajamento com o meio cristão foi tão profundo que até hoje me confundem com aquele “outro pensar”. Serei sucinto. Falando de gente “doida” e de “perturbados”, em geral, é uma realidade comum de se ver-sentir nos ambientes ortodoxos do mundo cristão. Falando ao telefone com mi Madrezita de Beagá, ontem, à tarde, escutei-a com seus causos sobre críticas que cansou de levar porque bebe, faz Krav Magá na idade dela, etc e tal. Críticas do povo cristão. Sorri e concordei mais uma vez. É por isso que viver em meio aos ortodoxos não me faz bem. E por que não? Porque tenho mais o que fazer que ouvir o “certo de alguém” ser o certo de todos. São exatamente quase uma da tarde neste domingo ensolarado. Pergunto-me: uma cerva geladinha não seria boa pedida neste momento? Lógico que sim! E se algum ortodoxo desses com o “sentir” de juiz togado da vida alheia resolvesse me criticar por beber? De início me perguntaria de que planeta este “ser” seria? E depois, sinceramente, seria simples e profético. Pra que serve o botão “f***-se” nestas horas, heim?

Coisas de tio...


Recebo a informação que o sobrinho brasiliense passou para a UnB (Universidade de Brasília) e para a Universidade Federal de São Carlos. Parabenizei aquele “desnaturado” que não me ligou na hora. E por que deveria? Porque este tio que digita sílabas neste texto foi o mesmo que o acompanhou em dias de provas. Já um dos sobrinhos daqui do Rio entra para as Forças Armadas nesta segunda-feira. Mais outro monstrinho por quem sou apaixonado. Sim, sou tio presente. Duvida?

Aviso aos "orkuteiros" que aparecem por aqui


A idéia deste blog nasceu quando quis diminuir as muitas letras no meu perfil do Orkut. Como a apresentação já tava ficando longa demais por lá, resolvi parir a possibilidade de "linkar" o meu perfil do Orkut a este blog. Deu no que deu. Espero que leiam e entendam os posts "Tô Dentro...", "Tô Fora...", "Rapidinhas de mim...", entre outros, como meros indícios do meu pensar. Eu, porém, sou mais que um indício. Sou um todo que é em Deus que é tudo em mim.


Sejam todos bem-vindos!

Sim a...



[SIM A] Graça que é maior que a vida.
[SIM A] Vida e suas [VIA]-bilidades.
[SIM A] Soli-[DAR]-iedade na vida.
[SIM A] Vida com [SIMPLES]-cidade.
[SIM A] Deus que é livre em tudo.
[SIM A] Tudo que forma família.
[SIM A] Gente do bem: luzeiros deste mundo.
[SIM A] Bossa nova e novas idéias.
[SIM A] Abraçar e ser abraçado.
[SIM A] Toda forma de amor.
[SIM A] Todo amor sem forma.
[SIM A] Toda forma sem fôrma.
[SIM A] Toda diversidade.
[SIM A] Certezas maduras.
[SIM A] Sorrisos pueris.
[SIM A] Que me respeitem!

Não a...






[NÃO A] Tudo o que é mera falsificação.
[NÃO A] Deus encaixotado na religião.
[NÃO A] Toda verdade sem conteúdo.
[NÃO A] Baladas e sua “cultura-gueto”.
[NÃO A] Insensatez e aos insensatos.
[NÃO A] MSN como “cultura do nada”.
[NÃO A] Pagar com a mesma moeda.
[NÃO A] Coisificação do ser humano.
[NÃO A] Cantadas no mundo virtual.
[NÃO A] Tudo o que sufoca.
[NÃO A] Amor sem prática.
[NÃO A] Fé vazia de amor.
[NÃO A] [MAL]-e-dicência.
[NÃO A] [VIL]-o-lência.
[NÃO A] Que me rotulem!

Rapidinhas de mim


  • Carioca merrrrmo! Só troco esta cidade de alma tropical por uma boa proposta de emprego ou pra viver a certeza de uma cinematográfica love story. (rs...)

    Canhoto numa família de destros. Nada demais se considerar ser vascaíno num ninho de flamenguistas...

    Ser errante que, às vezes, acerta. Acerta depois que tanto errou: no chão do meu barraco a humanidade se alastra! Mas também um ser que NÃO RESPONDE a mensagens coletivas. A falta de criatividade me desestimula. Digo a mesma coisa em relação aos seres insensatos, que transformam Orkuts e blogs em Casas-da-Mãe-Joana (com todo o respeito às mães de santo!).

    Ser que NÃO ESTÁ à procura de paqueras virtuais. O mundo da virtualidade é movediço, platônico demais, uma irrealidade no estado gasoso. Não há como abraçar uma fumaça! (rs...) Portanto, se confundiu as coisas é porque anda pela cidade sem lenço, sem documento. Bom que procure uma pousada em outras terras!

    Amante das artes, da literatura, da boa escrita, dos neologismos criativos, das pessoas do bem, de gente com fé na vida, de gente com arte no sorriso, de gente com senso de justiça, de gente saudável, simples e sincera.

    Casado com as palavras, tanto as que se escrevem quanto as que se dizem. Faço prazerosamente uso de cada palavra nas defesas dentro dos Tribunais tal como faço nas aulas e palestras que dou. Mais de uma década dando aula de catequese para jovens e adultos. E se tentarem me calar, o que faço? Falarei com as mãos. Ser intérprete de LIBRAS acabou me facilitando a experiência de estar bem casado com as palavras, até aquelas ditas por meio de sinais!

    Apaixonado pela riqueza que forma o ser humano, tanto que aprendo com gestos os mais simples e aparentemente banais. Acho que fui contaminado com as leituras de Antoine Saint Exupéry (“O Pequeno Príncipe”, “Terra dos Homens”, etc) na adolescência. Curto muito estar ao lado de gente “normal” que, pra mim, é o incomum, o diferente. E todos o somos, basta olhar de mais perto! Sem neuras ou resquícios de qualquer natureza!

Necessidade



"As pessoas precisam de pessoas, mais que de sol e dinheiro".
(Cinara Diniz)

E eu assino embaixo!

Poesia encontrada em Drummond


Penetra surdamente no reino das palavras. Lá estão os poemas que esperam ser escritos. Estão paralisados, mas não há desespero, há calma e frescura na superfície intata. Ei-los sós e mudos, em estado de dicionário. Convive com teus poemas, antes de escrevê-los. Tem paciência, se obscuros. Calma, se te provocam. Espera que cada um se realize e consuma com seu poder de palavra e seu poder de silêncio. Não forces o poema a desprender-se do limbo. Não colhas no chão o poema que se perdeu. Não adules o poema. Aceita-o como ele aceitará sua forma definitiva e concentrada no espaço.


Chega mais perto e contempla as palavras. Cada uma tem mil faces secretas sob a face neutra e te pergunta, sem interesse pela resposta, pobre ou terrível, que lhe deres: Trouxeste a chave?


Carlos Drummond de Andrade, in “Procura da Poesia”

A manobra, a defesa e o que é ser legal


No dia 16/12/2007 escrevi mais um texto sobre a agressão sofrida pelo niteroiense Ferrucio, 19, num dos blogs de amigos. Falava sobre a condução tecnicamente jurídica dos fatos com outro amigo quando me deu vontade de pegar o artigo e colar por aqui. Pensei na possibilidade de realizar uma denúncia sobre o que a radicalidade é capaz de produzir. Seja em que nível for. Depois, pensei, o próprio texto reprisado será uma denúncia em si mesma. Então, ao texto inédito neste blog.

Anteontem escrevi no blog do meu amigo Viula sobre a manobra jurídica que a defesa dos agressores do Ferruccio está intentando. A culpa agora é apenas do terceiro envolvido, um adolescente. E por que será que ele age voluntariamente como “bode expiatório”? Será difícil entender o por quê? Uma dica: ele tem menos de 18 anos, ou seja, é penalmente inimputável. Noves fora, e quanto aos demais? Foram apenas expectadores? A quadrilha agora é apenas de um (e este, pela manobra da defesa, é justamente o menor de idade)?

Como se não bastasse a situação por si mesma, as testemunhas não compareceram para reconhecimento dos agressores homofóbicos. Medo, foi o que disseram. No depoimento que o menor-bode-expiatório deu, afirmou que agrediu porque teria sido vítima de uma cantada, o que, segundo o carinha, muito o irritou na sua heterossexualidade. Evidentemente a reação a uma cantada – considerando a hipótese de que ela existiu - é a porrada até levar a vítima a desmaiar, chutá-la até arrebentar a cara. Ação e reação. Amor e ódio, essas coisas normaizinhas. Como tudo caminha na mesma intensidade, o que foi uns tapinhas? Afinal, tapinha não dói, né, Ferruccio?

Fato é que Ferruccio foi perseguido pelos três, tentou se esconder numa lanchonete mas não pôde permanecer porque o dono do local não queria confusão por lá. Ao tentar fugir pra preservar sua integridade física, foi alcançado e agredido pelos três. Eu disse: três!

Eu me pergunto uma seqüência de fatos, mas, por ora, lanço mão de quase todos os meus questionamentos para ficar com o mais básico de todos: por que incomodamos tanto a alguns? Acredito que a origem de tudo, porém, ta lá atrás. É da formação do indivíduo. Cresce-se (ainda que imaturamente) com a idéia imbecil que ser diferente é repulsivo, “anormal”, atípico e destoante. Pobres criaturas, a miséria que os define é tão grande que o que lhes sobra é monturo, é pó e cinzas. Se possível – e nós cremos que sim -, atrás das grades!



É somente quando a sociedade acorda e cobra providências que as tais míseras criaturas, ditas no parágrafo acima, voltam para os bueiros de sua vaziez de espírito. É somente quando os núcleos responsáveis pela formação do indivíduo se mobilizam (começa em casa, passa pela escola e se entranha como tempero na vida) que entendemos com suavidade que pensar diferente até pode, só não pode dizer que ser diferente não é legal. Ninguém melhor que os diferentes pra afirmarmos que é!

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