sexta-feira, 21 de novembro de 2008

No silêncio das minhas falas...


Quando falo em silêncio muitos entendem tratar-se de silêncio adequado ao outro, e não a nós mesmos. Pensar assim nos remete à razão (e à realidade, por analogia) de que o outro é sempre meu igual-desigual, ou seja, ele é meu semelhante diferente de mim. Gosto de pensar assim. O que entendo por medo, certamente, não o será para quem tenha uma fobia instaurada nos porões da psique. O que entendo por felicidade, seguindo-se a mesma adequação dos sentidos que as palavras denotam, nem sempre será o que o outro entenderá pra si. É uma questão de estrutura, de solo, de chão, de raiz – minha e dos outros. Não estou falando com as palavras acerca do óbvio relativo. Se tudo é relativo, não sei, o óbvio não me fascina. Gosto do estranho e desigual, do inerte e anacrônico. Falo do que é dinâmico, como as falas e todas as suas terminações verbais e nominais.

Quanta conjugação um corpo produz? Muitas em muitos aspectos. O gesto, o toque, o movimento, o balanço, o descanso, o ir e o vir. Conjugações metódicas. Falas retóricas. E o que dizer das conjugações sublimes, das falas tangíveis: viver, ser e amar? Certo que não serão percebidas com a mesma sonoridade no desatento e no ausente, no egoísta e no descrente. Assim como há muitos olhos, há muitos ouvidos espalhados pelo corpo. Clarice Lispector dizia: “porque eu, só por ter tido carinho, pensei que amar é fácil”. E não precisa ser poeta pra dizer que ela não está de todo equivocada. Fernando Pessoa, pelo prisma de suas cores, assegurava que “viver não é necessário. Necessário é criar”.

Eu não dispenso o sublime, nem me perco na incerteza dos transitivos mais indiretos. Amo amar o que me é próprio, viver nem que seja no esboço de um sonho e ser conforme o maior tamanho em mim. Tudo é muito peculiar ao espectro das cores de cada um. Uma orquestra! – eis o que os sentidos formam nos sons do corpo. A cada som uma cor na vida. E quanto mais luz houver mais intensas as cores perante o olhar e mais afinados os sons das falas. Tanto de quem se vê quanto a partir de quem olha (ou escuta).

O silêncio não poderia ser um elo desconectado dos diversos sentires. Há silêncio em toda parte. Percebê-lo já é outra história – a mesma das cores. Depende de “como” se vê. Depende de como se sente a vida. Depende do tal “qual é, neguinho, qual é?” que ouvi na repetição dinâmica do Marcelo D2.

E por que falei tudo isso? Nem curto Marcelo D2. Meu negócio é o silêncio sem repetições. Mas vejo que há razão na argumentação, seja ela em prosa ou verso. A argumentação do corpo do outro. A nossa também.

Tenho procurado alguns silêncios, mas eles não têm o poder de me impedir a nada que queira. Ontem, por exemplo, mostrei a duas amigas o que é o silêncio gargalhento. Fomos assistir “A mulher de meu amigo”. Ríamos tanto que nada nos impedia de manter comunicação. No meu silêncio, como falo! E como canto, e como grito, e como silencio!



"Amo amar o que me é próprio, viver nem que seja no esboço de um sonho e ser conforme o maior tamanho em mim. Tudo é muito peculiar ao espectro das cores de cada um. Uma orquestra!"


Imagina se conseguiria viver no silêncio sem falar! Não usar a voz até que conseguiria (com certo esforço, concordo), mas não falar? Qual é, neguinho!? Que desperdício! E quem acha que consegue, explique-me como se faz para não tocar e não sentir, pra não dizer as falas mais agudas da orquestra, como amar e ser.

26 comentários:

Serginho Tavares disse...

você sem poder falar seria impossível e eu preciso de você.
de sua voz assim como sua escrita.
de seu tempero e do meu destempero

te amo
beijos!

Anônimo disse...

Antes de iniciar o meu comentário que é grande quero dizer que você pode fazer silêncio à vontade, mas que estou com saudades da sua voz, ah... isto ninguém vai me proibir de sentir e falar.

Filho, vim apenas agradecer por esta mensagem explicando muito bem "No silêncio das minhas falas...".

Claro que entendi tudo e com muito amor maternal e aproveito para deixar um pequeno texto que achei lindo. O livro se chama "MORAR NA CASA DO AMOR", é de um monge beneditino.

"O anseio por amor puro".

Quando dizemos que uma pessoa é toda amor, não estamos nos referindo ao seu grande amor pelo cônjuge, namorado ou namorada. Existe também um amor que se dirige a todos, a todas as pessoas, aos animais, às flores, a uma atividade. Existe o amor ao momento. O amor é evidentemente mais do que estar apaixonado por outra pessoa. O amor significa o cuidado benevolente para com todos. Uma pessoa que é toda amor trata a si mesmo amorosamente, toca com carinho as flores no seu quarto (coração), afaga o cachorro (gatinha) que vem ao seu encontro, consegue contemplar a paisagem com amor. Ela irradia um calor e um amor que fazem bem a todos que estão próximos. O seu amor não é artificial. Ela não precisa arrancá-lo da sua agressividade. Ela compreende as pessoas ao seu redor. Reage com misericórdia e doçura, e dispensa julgamentos duros. Verena Kast fala aqui de uma amorosa atitude em relação a tudo, não apenas a um "tu" concreto. Para ela, o amor não é apenas um sentimento entre as pessoas.
(...) O amor para Dostoievski abrange tudo. Ele se dirige a tudo, jamais a uma única pessoa. O amor descobre em tudo o mistério de Deus, em cada semblente humano, mas também em cada grão de poeira, em cada folha de grama...
__________

Meu anjo, eu me perderia no meio de tantas coisas bonitas que li nesse livro e traria com todo carinho para você.

Quando você diz "Meu negócio é o silêncio sem repetições. Mas vejo que há razão na argumentação, seja ela em prosa ou verso. A argumentação do corpo do outro. A nossa também", gostei imensamente e tenho certeza que não terás mais repetições.

Meditei muito neste seu escrito e por fim tirei uma conclusão para mim... O amor que existe dentro de mim é a minha força.

Sabe, meu filho, depois de tantas tempestades que já aconteceram depois que meu esposo se foi, se não fosse este amor, hoje eu não estaria aqui te escrevendo, te enviando mensagens, e-mails e tentando obter alguma notícia, mas Deus está no controle e é só Ele para me entender.

Fica com Deus, meu anjo, não se preocupe com a mãe, vou ficar bem.
Beijos, madrezita.

Gosto desta fala de Paulo "Tudo suporta, tudo crê, tudo espera, a tudo resiste" (1Co.13:7)

EU SABEREI ESPERAR ATÉ QUANDO EU VIVER, POIS VIVO PELA GRAÇA!

Ana. disse...

Amei a forma como escreves!
Já está em meus favoritos aqui!
rsrrss

Nada seria se não houvesse o falar,para transmitir o amor a todo ser...

"Explosões de várias conclusões acontecem por aqui...."

Abraços!

CARLA ROCHA disse...

LINDO!Eno meu silêncio após ler seu texto, a sensação de mil sons! Grande abraço, parabéns!

[Farelos e Sílabas] disse...

...

Serginho:

Sem medir as palavras, o que seria de nós sem as falas?!

Fala do corpo, fala do sentir, fala dos (des)temperos...

Suas palavras sempre falam, suaves, diretas,
Me fazem sorrir... ah, que bom!

...

[Farelos e Sílabas] disse...

...

Mãe:

SAUDADES em sons para além das palavras. Um sentir pra tu sentires!

“O amor que existe dentro de mim é a minha força”. Não está fora, esteja certa, está dentro de nós. Isto, posso dizer, vai contra tudo o que gostaríamos que fosse! Nós é que costumamos nos distrair (às vezes, alimentando-nos com os sentimentos enganosos, como o de esquecimento, de desamor, de esfriamento, etc).

Não irei me preocupar, irei me ocupar em dizer que tudo seguirá bem. Os móveis estão sendo reordenados. A casa continuará linda. Reordenar é mudar, é seguir o curso das circunstâncias (afinal, nada é por acaso. Mesmo!). Mudar nem sempre satisfaz à nossa natureza...

Sabendo que esperarás não irei tecer comentários. Se os fizesse me contrariaria...

Beijo!

...

[Farelos e Sílabas] disse...

...

Mãe II:

Relendo o texto extraído da obra "MORAR NA CASA DO AMOR", concluí: deve ser uma leitura-alimento!

Obrigado, minha lindona! Gosto deste compartilhar... a gente fica mais fortinho, né?!

(rs)

...

[Farelos e Sílabas] disse...

...

Ana:

Sim, é verdade. O amor acontece nas mais diversas falas, na linguagem que lhe é própria, fruto da consciência. O amor tudo sabe, tudo espera, tudo crê... um dicionário de vida!

Abraços na linguagem do AFETO!

...

[Farelos e Sílabas] disse...

...

Carla:

Aqui dentro bateram sinos retumbantes: O-BRI-GA-DO pela orquestra do teu sentir!

...

Alex&Elisa disse...

Um...o silêncio (físico-concreto-sentido-audível-textual-mudo...).

As vezes o silêncio da biblioteca se torna ensurdecedor...

Adoro o uso dos matizes e tons...me soa divertidamente conhecido...hahaha

Abraço
Um sorriso
Um beijo na testa
Um aceno
Dois Afagos
Um desejo bom
Um banho de chuva
E todas as risadas...

Alex

ladyneide disse...

"Eu te amo calado, como quem ouve uma sinfonia de siêncio e de luz"...


Beijosss azuisss, harmonizando um dia plúmbeo! (:

[Farelos e Sílabas] disse...

...

Alex-o-eu-casal:

O silêncio alucina, meu caro!

...


Vários farelos
Poeira de sílabas
Uma palavra toda
Com bastante sentido
Num abraço demorado
Dinâmico como pinga-pinga
Pra terra molhada brotar afago
E o dia nascer FELIZ pra nós todos!

...

[Farelos e Sílabas] disse...

...

Neidinha:

BRAVO!

Amar calado, no silêncio, falando em tons de pele, saudades, olhares, cores de

AMIZADE

que um dia se encontrou pra nunca mais destoar em qualquer cor de céu!

Beijos plurais nos mais altos sons de nosso silêncio interior!

...

Quer uma xícara de chá? disse...

Costumo falar com meu corpo, costumam entender-me por sinais. É imprescindível para nós que vivemos neste silêncio a compreenção de nossos sutis e singelas formas de comunicação, porque mesmo sem verbalizar eu grito, discuto, choro...

O siLêncio é muito sábio.Ele nos edifica.

Leonardo disse...

Cara.. eu sou silencioso, amo o silêncio e não abro mão dele em mim e o recomendo a todos!


Abração

Markus disse...

Olá
Obrigado pelos comentários.
A justiça é igual para todos, porém é mais igual apenas para alguns. Isso caracteriza uma sociedade de poder separatista...aliás, parece que é característica do ser humano a disputa pela superioridade, seja até mesmo em grupos discriminados que criam suas próprias subdivisões para continuar o processo da discriminação.
Um grande abraço e um bom fim de semana

Hugo de Oliveira disse...

"Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas." (Saint Exupery)

Você cativa qualquer pessoa através das palavras.

Amo-te! Meu amigo.

[Farelos e Sílabas] disse...

...

Amigo da xícara de chá:

O corpo é uma orquestra de sons e um estampado extraordinário de cores e sinais! E tudo que respira, fala! Fazes bem ao “se” ouvir por ele!

Bom te ler por aqui. Volte mais vezes. Brindemos com chá!

...

[Farelos e Sílabas] disse...

...

Leonardo:

Tá falado, meu nobre!
Dizer mais pra quê?
Abração!

...

[Farelos e Sílabas] disse...

...

Markus:

Diria que a lei é igual para todos, o exercício dela também pode ser, porém, a aplicação dela pelo Estado ao indivíduo, cidadão ou não (aqui se torna outro conceito, mas não vem ao caso dissecá-lo neste momento), vê-se pela experiência do cotidiano que não. De fato, como disse, é mais igual apenas para alguns...

Não vejo a questão pela sua ambivalência, contudo, percebo que se disputa desde sempre, até pela vida dentro das cadeias alimentares aos sistemas políticos pelo que prevalecerá no Poder. Tudo isso, porém, o digo com ares de esperança. É-nos mister como cidadãos conscientes o agir em prol da diminuição dos males – a erradicação já seria o ideal incompreensível diante deste cenário.

Valeu pelas palavras, meu caro. Foi-nos um bom exercício!

Agora é começar... o verbo diário!

...

[Farelos e Sílabas] disse...

...

HSLO:

“O essencial é invisível aos olhos” – da mesma obra

E no que me concerne dizer, vejo como és um agente do bem!

Idem, muitos “idens” para ti,
para tuas palavras,

A
M
I
G
O
!

...

Willians disse...

E fácil dizer sem falar,...
Mas o que é pra se fazer ouvir, pra que gesticular?
O corpo diz mas também pode concordar!
E ouço, como ouço,... mas como é bom falar.

[Farelos e Sílabas] disse...

...

Willians:

E como é bom saber que é possível, ainda que nos faltem palavras!

Como é bom falar, como é bom dizer, como é bom viver!

Grato por palavras tão sonoras! Volte mais vezes!

...

Alex&Elisa disse...

(suspiros)

Como irei responder MEU DEUS?!

(dúvidas crueis...margaritas, tequilas e muita emoção)

Cardo-ado-ado...você é impossibilidade adorável...

Beijos com sabor de tequila+cointreau+suco de limão+ açucar+ limão na borda com sal

Ummmmmmmmmmmmm...bebi demais hoje, ó...hohoho

Adriano Queiroz disse...

Penso que silêncio na esta na ausência de fala. Para mim, silêncio é um estado pessoal e não apenas externo ou ambiental. Silêncio é o momento onde você sente o mundo intensamente, a percepção aumenta. O olhar do flerte é silêncio, não importa o cenário. A vontade de mandar todo mundo calar a boca em reunião de trabalho é o seu silêncio pedindo socorro. Orgasmo é silêncio, não importa o ranger da cama e os gemidos. Ler é total silêncio. Ouvir música, dormir, cantar, escrever, falar com plantas e animais é silêncio. Quando estamos sós e silenciosos nos enfrentamos. Autoconhecimento precisa de silêncio. Silêncio é espelho.

Como diz a música do Walter Franco:
"Viver é afinar o instrumento
De dentro prá fora
De fora prá dentro
A toda hora, todo momento
De dentro prá fora
De fora prá dentro"

Abraços.

Ariane Rodrigues disse...

Texto maravilhoso! Me fez passear um pouco mais dentro de mim mesma que atualmente vivo a navegar num mar de silêncios...Beijos!

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