Passos generosos e nada acanhados. Uma lágrima teimosa, daquelas incautas, pula pela janela da alma. Até a saudade mareja os olhos e acaba umedecendo o rosto no trajeto vertido. Que horas são? – a pergunta é pra eu mesmo me ouvir. Faz um bem danado saber que o pensamento não tá preso lá atrás. Se assim não fosse, a esta hora estaria fazendo alusões ao que vivi na sexta-feira passada. Sete dias se passaram. Parece sete dias de caminhada em profundo silêncio-de-mim...
Aqui dentro um “sempre” ora me atordoa, ora me indispõe comigo mesmo. O tempo, às vezes, aparece apenas vestido de “sempre”. É quando o que parece eternidade não tem fim. Uma lição inesperada – e ao contrário do que imaginava –, é que nem todo “para sempre” é contente. Tem sempre alguma coisa diferente pra acontecer. Um sempre-algo-inesperado. A saudade. A dor. A tristeza. A dúvida estéril. O que trará o Carregador de minutos seguintes?
A vida é uma longa espera. Uma estrada e uma espera, diria. Tudo acontece num minuto e basta. Passou. A gente fica com cara de não-sei-o-quê! Mas até a cara passa. Amarrada, se solta. Solta, se fecha. Novamente se abre e um e outro “talvez” desconcerta o “sempre”. Tudo, no entanto, muito lentamente...
O que há lá fora que me encolhe de tanto frio? Nenhuma resposta. Insisto. O que há aqui dentro que me arrepia diante de tanto frio? O que foi e que não volta mais. O instante que nunca é igual ao que passou. A lembrança que nunca mais se terá senão a que eu mesmo aprisionei. O cheiro, a pele, o riso, o barulhinho dos passos de quem se perdeu... Tantas lembranças! De repente, a única certeza. O Carregador de minutos seguintes voltará, mas a gente não sabe o que traz. Isso não soa alguma coisa fria? Tem dias que sim. Tem dias que não. Hoje, sinto-me exercitando o direito fruto da liberdade pra dizer que sim. Este é o meu “sempre” dentro do qual o meu agora está preso.
É precisamente neste agora no qual reflito que há tanto frio. Tudo o que eu queria era só duas ou três coisas pra aquecer, quem sabe deseternizar uns fatos. Que a saudade me avisasse quando tivesse que doer. Que os dias voltassem a ter as 24 horas que me acostumei. Que meu caminhar com os próprios pés não viessem a se cansar, mesmo sabendo que algumas companhias se foram.
Os passos prosseguem. Não me perguntem onde estou. Até eu mesmo tenho me feito o mesmo questionamento. Se estou ficando louco? Pasmem! Ainda há gente que crê ser possível a imunidade em meio à selva urbana?! De perto, repita-se o poeta-cantor, ninguém é normal.
Caminhando e cantando emudecido avisto lá na frente uma casinha com lâmpada acesa. Altercado com os próprios passos, me aproximo pouco a pouco. A casinha se agiganta na medida da aproximação. A luz se torna forte demais, parece não caber naquele lugar. De fato, não cabe. Começo a perceber as coisas se encaixando. Elas sempre se encaixam quando os passos se aquietam. Não é uma casinha qualquer, é um ambiente de portas abertas. Não é uma lâmpada qualquer, é um sol querendo estar a pique.
Alguma coisa me diz que todo este cenário tem dedo do Carregador dos minutos seguintes. De repente, um assovio desliza pelo vento. Me alcança e me convence a se aproximar mais, a chegar bem perto, a retomar o prumo e a convidar o sol pra sair por qualquer das portas. É uma escolha. Acredito que tenha a ver com a liberdade que, heroica e corajosa, nos lança para o caminhar com os próprios pés.
Meu instante de reflexão é como faca de dois gumes. Corta meu pensamento, multiplicando-o em muitos outros. Pouco a pouco um fio de certeza vai quebrando todo o frio. Digo um fio porque tenho aprendido que nem toda a certeza cabe dentro da gente. Somente a que for necessária. É hora de buscar o sol pra colocá-lo novamente no firmamento, mesmo que fique tortinho à primeira vista. Pra que perfeição nessas horas? Há muito trabalho a fazer. Apesar das saudades, há muito o que se fazer. Tanto lá fora quanto aqui dentro...
7 comentários:
"A vida é uma longa espera". Concordo com você amigo...a todo momento estamos esperando algo, em busca de algo.
Gostei muito do post viu.
abraços
Querido, estou sem palavras e uma lágrma pulou dos meus olhos...
Não quero pensar e nem falar, pois sinto tudo o que você está sentindo porque o paizão de cá, nem se despediu de ninguém. Se foi... O Carregador o levou para perto dele e o paizão daí está também lá... quem sabe papeando...
Filho, fica o meu beijo e meu abraço bem apertado e bem aconchegante.
Mãezinha mineira, Anna Maria
Que texto maravilhoso! Enquanto caminhava por ele, um espelho, depois outro, depois outro, depois outro, refletindo o que eu sentia. O Carregador de minutos e os seus agoras, que tantas vezes passam despercebidos porque o pensamento insiste em nos levar para onde não estamos.
Adorei.
...
Algumas-outras-palavras...O que dizer acerca do que todos vocês semearam nestas palavras? Tudo é tão lindo, tão lindo como o brilho do Sol!
A gente sabe primeiro é com o sentir. Depois é que os olhos acenam... Não é assim com o essencial?
O Carregador de minutos seguintes sempre dá conta do recado. A gente caminha, cada qual com seu próprio passo, se miúdo ou agigantado, não importa, cada um faz seu caminho. É tudo tão individual quanto o olhar da dor e da alegria. São indizíveis para os de fora. Tem-se que estar do lado de dentro. Tem-se que saber sentir o mesmo sentir. Por isso mesmo cada qual é cada qual rumo ao seu destino-caminhar-existir.
Lanço para o ar um punhado de esperança. Elas colorem o firmamento sobre nós. Há gratidão escorrendo pelos cantos da paisagem. Vês? Lembremo-nos que “o essencial é invisível aos olhos”...
Beijo aquietado para os que aparecerem aqui marcando as terras com palavras-sentido!
A vocês, Mãezinha Annita, Ana Jácomo e HSLO, um beijo a mais pela sensibilidade exposta!
Cardo
...
sempre se ha o que fazer meu amigo querido
sempre
acredite e conte comigo
adoro você
Bom à beça te ver por lá. Quanta sensibilidade e beleza nas suas palavras. Como o meu coração sorri com isso toda vez que o Carregador de minutos traz essa oportunidade com ele: conhecer pessoas que se arriscam a ser.
Nossa, como sinto isso também: "a gente sabe primeiro é com o sentir. Depois é que os olhos acenam..." É assim, respondo, daqui do meu sentimento, que acontece com o essencial. É linda essa chance de encontrar pessoas que sentem e dizem. Somos loucos diante da perspectiva de um mundaréu de gente. Já nos permitimos ser um pouquinho mais livres, na percepção, de outros tantos. Mas, olha só que bom: não estamos tão sozinhos como em muitos trechos da jornada acreditamos. :)
Beijo.
Que bom o regresso___________________
Sentia a ausência das palavras assim «««
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