domingo, 12 de abril de 2009

Num domingo de Páscoa tão diferente dos demais


Há muitas gentes nas ruas. Tantos rostos. Tantas histórias. Cada uma delas, porém, um universo particular. Naquele infinito que somente cada um pode desvendar – o chamado “eu” – a dimensão existencial de tudo o que vivemos e recordamos. Lembranças me povoam as constelações que cabem em meu próprio mundo. Explosões se irrompem aqui dentro e, sem nem perceber, rios caudalosos nascem sulcando os poros do rosto até formarem uma foz corrida abaixo. São chuvas, não são apenas águas. Chuvas de lágrimas. Uma e outra lembrança – talvez o conjunto delas – passando como filme aqui dentro. Imagens de meu pai, das nossas conversas, dos instantes de agonia quando queria me ver mas seu olhar se esquivava para outra dimensão bem maior que a minha. Queria ter-lhe contado tantas coisas de mim. Queria ter-lhe mostrado tantas vitórias que estão por vir. Queria ter-lhe compartilhado alguns sonhos, os mais recentes, os de hoje. Por outro lado, se o “crómos” – o nosso tempo multifacetado em horas, minutos, segundos, centésimos, e por aí vai – não convergiu para as oportunidades que delas sinto falta neste instante, sei que o “kayrós” – a dimensão pra lá de quântica, talvez pelas conseqüências de eternidade que somente a Graça pode se autoexplicar – guarda um quê de mistério com ares de certeza, fruto da fé. Um dia nos veremos para continuar o que aqui a limitação das coisas não nos permitiu. Bem, falo por ora. O pensamento engravida a lembrança em dores de parto como as das saudades. Sou um gestante em potencial assim como cada um que produz as mesmas emoções. Gestantes. Grávidos de lembranças. As dores de parto, mais uma vez, se aproximam. É hora de me aquietar por uns instantes e deixar fluir os fluxos caudalosos que me formam cascatas lindas de espontaneidade, amor e saudade de meu pai. Ontem, em meio a dor da perda, sepultei meu pai. Hoje, no domingo de Páscoa, inspiro-me pra ressuscitar todas as lembranças como sementes de afeto, as que mais gosto de semear. Como meu pai fazia. Tal pai, tal filho. Que orgulho!

Sei que há brotos nascendo aqui no meu peito - um processo natural quando se rega tais sementinhas. É por isso mesmo que este "fim" não termina aqui. Até breve!




Nota 1: Como diz a letra de uma canção, “a saudade eterniza a presença de quem se foi”. Perdas Necessárias. Quanta verdade!

Padre Fábio de Melo - Perdas necessárias (Com. Transforme em Jardins!)






Nota 2: aos que não entenderam as razões de meu silêncio, aos que cogitaram mil coisas, aos que souberam e compreenderam, aos que telefonaram pra oferecer o coração, aos que semearam palavrinhas por e-mail e outros recursos, aos que rezaram (tanto em silêncio quanto em letras engravidadas de sentimentos), aos que, mesmo sem entender, foram eloqüentes no silêncio e se mostraram presentes do mesmo modo, um punhado de gratidão espalmado na direção de todos. É dado de coração, ainda que pela mão deste ser saudoso, mas convicto que a paz é o melhor lugar pra se estar.

5 comentários:

Alex&Elisa disse...

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. Sinto muito
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Mãezinha, Anna Maria disse...

Meu querido, meu filho!

"Ele enxugará suas lágrimas!"

É emocionante tudo que você escreveu sobre tantas coisas bonitas que você ainda queria falar com seu pai... Realmente é um sentimento normal quando a gente vê inerte aquele corpo que poucos instantes antes tinha vida e de uma hora para outra, se apaga.

Conheci sua pai e sempre tive muita admiração por ele, apesar de nunca ter falado disto nem com ele e nem com você.
Um homem inteligente, prestativo, levantava bem cedinho, coava o café, comprava o pão e depois ia direto para o trabalho de supervisionar a água para não faltar no bairro.
Tudo isto, meu filho, eu admirava em seu pai. Claro que ele tinha muito mais para ser admirado e para se dar valor.

Quando perdi meu esposo, "paizão" como você o chamava e tinha tanto carinho por ele, demorei muito aceitar a morte dele, mas depois a fé que devemos ter Naquele que no criou e que nos tira a vida, me fez aceitar a morte como um começo de uma história de amor.

Filho, se de momento é duro aceitar a separação, se há tantos mistérios circundando o seu coração pela perda do seu paizinho, volte seus olhos para Deus e faça uma prece de esperança.
A lembrança dele, será eterna até o dia que todos se encontrem na glória eterna.

Todos as coisinhas que ele deixou será sempre uma lembrança...
Até no silêncio que fazemos, pensando tantas coisas... sempre lembramos daquele que se foi.

O silêncio é a liturgia da palavra no templo do amor, na catedral da oração. É sempre um diálogo de nós, com Deus.
Tenho aprendido tanto... O amor-comunhão dispensa o artifício da palavra.

"Quem fala, semeia. Quem escuta, colhe..."

Quem escuta o Criador colhe suas mensagens. E colhe, acima de tudo, a paz e o amor Dele.

Querido, com ternura te abraço e te beijo, com calor da mãe que te ama no amor incomparável do Pai.

"O silêncio que eu perdi...
Se alguém o encontrou, por favor, queira devolvê-lo.
Preciso dele para viver, para respirar, para reencontrar-me com meu passado e meu presente"!

Serginho Tavares disse...

meu amigo querido
eu sei que plantei uma grande amizade quando estive no Rio que gerou e gerará sempre muitos frutos
te adoro muito e espero que possamos nos ver logo
um excelente começo de semana pra você e beije muito que hoje [dia 13] é dia do beijo

Markus disse...

Passei aqui, de coração na mão fiquei, liquefeito me fiz de novo.... Emotivo demais, deixei fluir.
O melhor não se vai, o melhor fica conosco.
Abraço habitual, voce já conhece.
Fica com Ele.

Sergio Viula disse...

Querido Cardo,

Eu sei que já mandei uma mensagem por depoimento no orkut, mas decidi registrar aqui o meu carinho por vc e minha solidariedade com a tua perda. Eu perdi alguém que amava mais do que qualquer outra pessoa na minha família, excetuando meus filhos - minha avó. Para quem nunca teve uma avó como ela, a comparação pode parecer tola, mas só eu sei o quanto ela significava para mim.

O tempo vai anestesiar a dor, mas nunca curar a ferida. Cada perda de um amado é um golpe da morte sobre a vida. Nossa revanche é viver o melhor e mais gostosamente possível, aconchegando ao peito aqueles queridos que continuam ao nosso redor.

Beijo especial, querido.

Sergio Viula

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