sábado, 30 de agosto de 2008

‘Somos Um’ e raios de luz


Se vocês soubessem como o tempo mudou de ontem para hoje – coisas do clima carioca –, talvez, não poucos se surpreenderiam com a radicalidade da mudança no tempo por aqui. Um sol gostoso no prato principal de sexta-feira converteu-se num dia tipicamente londrino para o nosso apetite de hoje. Cinza escuro e frio. Eis os ingredientes. Será que choverá granizo daqui a pouco? Que nada! Mera coloração plúmbea desde a manhã. A esta altura, já abraçamos a noite. O frio foi chegando timidamente. Chegou e aquietou-se. Frio e chuva neste momento fazem amor pelo ar afora. Há quem se arrepie. Não me incomodo.

Trancafiado no quarto, esboço palavras para aquecer o abraço da noite. De repente, lembranças. Bastou-me a inspiração de dois raiozinhos-amigos. Madrezita e Neidinha. Ambas me iluminam de formas multi-variadas. Ambas me enriquecem páginas e páginas com suas cores. Pus nos ouvidos o fone para ouvir “Somos Um” [vide a imagem da capa acima], projeto de Jorge Camargo. Presente de mi Madrezita. Há quanto tempo não ouvia algo novo de pura qualidade! Canções densamente poéticas, suaves e profundas na simplicidade dos versos. “Fale de amor, se for preciso use palavras” é uma das mais belas do álbum.


Fale de amor o espelho d´agua de seus olhos
Abra os portais do seu abraço
Se for preciso use palavras.
Fale de amor trocando os sons pelo silêncio
Tornando voz em gesto e ato
Se for preciso use palavras


Conforme me disseram é para ler e ouvir. Refletir e crescer. Recomendo a quem desejar. Fiquei feliz com o presentão. Aliás, sou grato a esses dois seres que clareiam as fortes cores do imenso céu azul da existência. Fazem-no sem se darem conta. Isso é o bastante. Graça na ponta do pincel, acho que deve ser isso. Acho, não. Estou certo. É Graça na ponta do pincel. Eu só tenho a dizer “gracias”. Até que a noite ficou mais encantadora. Elas nem se dão conta como seus raios me atingem em pleno Rio de Janeiro...

sexta-feira, 29 de agosto de 2008

Reflexões de um chocolate branco


Jantei no dia de hoje. Afinal, os primeiros minutos de sexta-feira já não mais eram os últimos de quinta passada, dia de se jantar. Eu não o fiz na quinta. Deixei para os primeiros instantes da sexta. Copiando quase não-sei-quantos gigas de músicas para meu cunhado, me perdi em meio aos minutos e aos segundos das horas. Perdi quase todos os telejornais. Quase. Restou-me a companhia do Boris Casoy. Serviu. Acho que cochilei. Nem sei. O chocolate branco que comi não foi o dos melhores. Envólucros! A gente sempre derrapa nessas pseudo-certezas que nos seduzem os olhos. Pensei que fosse um chocolatão daqueles! Só envólucro, bonito por sinal. No caso em questão, não foi lá aquele chocolate que imaginei...

Tá bom, tá bom, o conteúdo é que pesa. Mais que o envólucro. Disso tô sabendo. A gente se engana fácil, né? Só precisa querer. E quem disse que a gente não quer ser enganado quando sabe que ta indo apenas pelo envólucro? Conversa fiada quem diz que não! O chocolate não era lá essas coisas. Mas comi. Quantos não fazem o mesmo? Agora, pense comigo: se fazemos assim com chocolates alguém tem dúvidas que não faríamos com seres humanos? Não se trata de mera pergunta questionativa, mas conceitual e instintual.

Graças a Deus pelos seres que se equilibram entre os instintos e a racionalidade domesticada pelos padrões de comportamento (que incluem as formas como se gosta). Nossas seleções naturais brotam daí, desse equilíbrio. Somos – e deveríamos nos lembrar disso – seres racionais. “A gente não quer só comida, diversão e arte. A gente quer a vida”, mandavam ver os versos dos Titãs. Eles é que estão certos. Bom, se me derem licença, ainda há um restinho do chocolate pra terminar de comer antes de dormir. Chocolate, gente! Eu disse, chocolate!

Esses dias que dias são?


Gosto de pensar nos dias, principalmente nos dias em que se comemora qualquer coisa. E por que se comemora? É, porque nem todos comemoramos. A gente esquece, acontece. Daí me lembrei de ter esquecido de ontem, 28 de agosto, dia de Santo Agostinho. Já escrevi sobre ele. É um dos meus santos preferidos. A vida, mas sobretudo as idéias dele me inspiraram em muitos conceitos que carrego numa linha calvinista do pensamento cristão. Tenho algumas obras dele em minha biblioteca, mas há frases memoráveis que não posso esquecer. São pele de muitos conceitos que me formam o pensamento. Eis algumas: (1) “Ninguém faz bem o que faz contra a vontade, mesmo que seja bom o que faz.” (2) “Dois homens olharam através das grades da prisão; um viu a lama, o outro as estrelas.” (3) “Conhece-se melhor a Deus na ignorância”. (4) “O mundo é um livro, e quem fica sentado em casa lê somente uma página”.

Que dia é hoje? Provavelmente dia de alguma homenagem. E acabei sabendo que o é mesmo. Ta no anúncio recebido pelo CEDIM, aqui no Rio. 29 de agosto, dia da visibilidade lésbica. Quantos sabiam, heim? Somos poucos. Faz parte. Acontece.

Mas não só de homenagens a gente caminha estrada afora. Há dias em que a gente pára e reflete além da naturalidade corriqueira do dia a dia. 29 de agosto também é o dia do combate ao fumo. A maioria de nós sabe que os filhos de fumantes adoecem duas vezes mais do que os filhos de não-fumantes e têm chances de começar a fumar, seguindo o exemplo dos pais. Também é sabido que a fumante grávida tem bebês com baixo peso, menor tamanho e maior chance de apresentar efeitos congênitos. E não é só isso. A fumaça do cigarro é o poluidor do ar mais constante e prejudicial à saúde que se conhece, pois as pessoas passam 80% de seu tempo em ambientes fechados. Qualquer pessoa que permaneça nesses ambientes poluídos pode ter irritação nos olhos, garganta e nariz, dor de cabeça e tosse, além de maior chance de ter câncer. Pois, é, gente...

Sabemos ou não sabemos? Não me respondam. Hoje é dia pra refletir e, se a consciência acusar, oferecer contribuição à sua moda.

Fica aqui, então, uma sugestão – ou, quem sabe, alguma homenagem –, nem que seja pelo reforço das palavras. De minha parte quero fazer diferente. Eis uma dica de leitura pra quem se interessa pelo conhecimento das afetividades humanas. Armários sem portas. Karla Lima e Pya Pêra. 260 páginas.

P.S.: Antes que seja corrigido. Sim, sei que no dia 28 de agosto também comemoramos o dia nacional do voluntariado. Aliás, aproveitando, amanhã, 30 de agosto é dia de mutirão nos postos de saúde para vacinação contra a rubéola. No Rio, a campanha destina-se a pessoas entre 12 e 39 anos de idade. Claro que tô dentro! Humpf!

quinta-feira, 28 de agosto de 2008

Onde estarão – Parte I


Onde estarão os cabeças-pensantes deste país? Estarão perdidos nas universidades no estrangeiro, patrocinados pela CAPES (leia-se verba do Governo)? E por aqui? Onde estarão os jovens, homens e mulheres que se antenam com o que rola no microcosmos, no seu mundo particular – seja ele o bairro ou a cidade, seja ele o estado ou o país ? Onde estarão? Não se vêem muitas cabeças em meio a tantas outras que rolam pela guilhotina do descaso. Pior, da indiferença. Simplesmente não se vêem muitas por aí.


Cabeças-pensantes. Verdade é que nunca se precisou de tantas nem de algumas. Precisa-se de qualquer uma. De preferência, cabeça que pense pra além de si mesma, do copinho de cerveja no final da tarde, das risadinhas infames pelo que disse mas ninguém nem sabe por que riu, da baladinha que é freneticamente esperada todos os finais de semana sem que sequer saiba-se como cobrar pela reforma da praça no bairro que tá uma merda ou mesmo como fazer uma simples coleta seletiva no lixo do prédio, enfim, de tantas outras coisas as quais chamaria realidade.

A gente vai se acostumando com a síndrome da responsabilidade transferida. “Tem gente pra fazer isso, pra que se preocupar?” – alguns amigos me dizem. É um estilo freudiano de ser, diria eu. Tudo é mera transferência pra não se fazer nada. Tenho amigos, inclusive, que só pensam em sexo. Bacana, mas é só? Outros amigos só querem festa. Uhu! Legal. E depois? Volta-se como era antes na terra de Abrantes? Mesmice. Razões pra não se fazer nada em prol de nada, menos ainda de ninguém. Que cabeças somos nós? A pseudo-revolução da geração coca-cola passou? Não, não perguntarei nada às viúvas e aos viúvos de Renato Russo. Os fatos são eloqüentes por demais... Sei que reinventamos as gerações de acordo com nossas dês-preocupações (pra não falar em alienação). Então, nada passa. Permanece, porém com outras novidades.

O Hospital de meu bairro tá fechando as portas. Referência estadual no combate a várias doenças infecto-contagiosas, o Hospital São Sebastião ta quase fechado. No dia do abraço simbólico no hospital, poucas pessoas do bairro presentes. Médicos e o pessoal da saúde eram em maior número. Avisamos, colamos cartazes, mas e daí? A agência postal quase fechou se não fosse o incansável esforço de uma amiga e eu colhendo mais de cinco mil assinaturas em todos os lugares, prédios e condomínios. Vejo que as ruas estão sem árvores. Vejo que as calçadas estão sujas e quebradas. Vejo que o posto de saúde Dr. Antônio Braga Lopes não t funcionando com a capacidade para a qual foi reinaugurado. Já estamos formando comissão pra falarmos com o secretário municipal de saúde. Sou político? Não, mero morador. Consciente. Tem gente que faça por mim? Deveria ter. Sou como os versos de Cazuza porque acredito que o tempo não pára. Sou notas da canção de Geraldo Vandré porque sei que devo fazer a hora e não esperar acontecer. Faltam é mais cabeças pra me ajudar a pensar junto. Ah, se houvesse uma espécie de polinização de consciência! Mas seria uma sacanagem muito grande empurrar para as abelhas o papel que nos cabe a cada um. Individualmente.

Nota explicativa: A inspiração para o texto se deu quando tentava conversar com uns amigos sobre algumas questões da atualidade. Falando sobre a convenção do partido democrata na cidade de Denver, nos EUA, que aclamou a escolha de Barack Obama como candidato à Casa Branca, fui percebendo que poucos se dão conta do que rola pelo mundo afora. Pior, quando perguntei se sabiam a respeito do histórico julgamento que ocorre no STF sobre a questão de soberania na Serra da Raposa do Sol, lá em Roraima, que encobre, na verdade, disputas acirradíssimas entre as tribos indígenas (donas das terras na reserva federal) e os grupos de arrozeiros, ninguém soube me responder absolutamente nada. Fazendo um pequeno teste, resolvi perguntar sobre a turnê mundial do novo álbum de Madonna. Não foi surpresa pra mim perceber que todos não só tinham conhecimento como estavam se preparando, inclusive já sabedores que haverá um show extra na cidade de São Paulo, à vista da grande procura pelos ingressos. Diante do relato, imediatamente me vieram à mente os versos da canção de Renato Russo: “Que país é esse?”. Este foi meu start point para desabafar um pouquinho com minhas inseparáveis palavras do momento. Como diria meu sobrinho Josué, de apenas três aninhos: “Ah, bom!”. E antes que alguém pergunte: sim, eu também curto Madonna. Tá explicado!

Discípulos da hippie viadagem


Jesus multiplicava pães, transformava água em vinho, andava sobre as águas, repreendia ventos e ondas; mas tinha um tesoureiro, recebia ajuda financeira, especialmente de mulheres; dava oferta aos pobres, mandava que dessem de comer à menina recém-ressuscitada, se cansava, tinha sono e sede e precisava de privacidade... Daí o monte solitário, as grutas inatingíveis, o deserto, o quarto fechado nas regiões siro-fenicias, e, sobretudo, daí o barquinho que Ele mandou que tivessem sempre disponível; pois, do barco, protegia-se do assédio da multidão e podia pregar a Paz em paz.

Para Ele, milagre era o que acontecia quando a necessidade se impunha sobre os meios humanos. Do contrário, ao invés de multiplicar pães, Ele dá esmolas; ao invés de transformar água em vinho, Ele pede água para beber; ao invés de andar sobre as águas, Ele usa um barquinho; ao invés de repreender ventos e ondas, Ele contorna o lago pela margem; ao invés de fazer chover maná ou criar dinheiro, Ele depende da consciência dos beneficiados pela Graça. E mais: ao invés de dar a vida eterna no corpo a quem ressuscitara, Ele manda que a pessoa se cuide para não morrer outra vez, e de inanição.

Milagres acontecem, mas é do trabalho que vem o pão nosso de cada dia — pensa um pai sério e crente!

Digo tudo isso por uma razão:

Muita gente que andava decepcionada com o falso evangelho, e que foi explorada emocional, psicológica, afetiva e financeiramente nas “igrejas da angústia”, hoje julga ter encontrado a Graça; porém, em razão dos traumas anteriores, agora, pelo relaxamento, traumatizam a Graça com a indiferença no agir, no trabalhar, no contribuir, no dar-se de modo missionário; e, sobretudo, na consciência de que o Evangelho precisa ser anunciado.

Então, na esteira desse andar, surge aquilo que no passado se chamava de “hippie viadagem”. O que é isso? Ora, é o pessoal que diz que vive do vento, mas na vida pessoal sabe fazer contas. Na década de 70 eram os hippies de boutique.

Sim! É um pessoal cheio de conversa sobre “o espírito das coisas”, mas que não tem espírito para fazer coisa alguma.

Milagres acontecem. Mas o dia-a-dia é feito de mulheres fieis que O serviam com seus bens. Pães podem ser multiplicados, mas o grande milagre é sempre a multiplicação da generosidade.

(...). Continue o generoso e grato a crescer em generosidade e gratidão, e, o indiferente, que continue até ficar empedrado.

É assim que a vida é; na prática! Quem tiver dúvida, que atente então contra si mesmo!

Nele, que andou na Realidade,

Caio

Amores eternos


Eu acredito nos amores eternos, ainda que sejam enquanto durem. Mas duram o quanto precisam durar. Pensando na durabilidade dos amores, imediatamente me vem à mente as certezas que a gente traz. A gente acredita em nossas próprias seguranças. Isso é bom, não tenho dúvidas. Assim, amar é sempre contínuo – mesmo que a gente nem se dê conta! – e o amor um ato existencial. Pra mim, enquanto se pode dar crédito há inspiração de oxigênio e confiança. A combinação é perfeita, diriam. Eu concordo. Penso também que não depende dele, o amor, qualquer sacrifício pra se manter valente. Depende é de nós. Nós o revestimos da eternidade. E não é só de valentia que to falando. É de decisão. Quem decide amar pra sempre tem suas razões (ou seriam raízes?). Pedirei licença para encarnar o espírito shakespeariano à la Romeo e confessar que amores eternos existem sim. Quem não quer um pra si, não importa por quanto tempo?

Por isso mesmo é que sobre tudo o que guardo em amor, guardo no centro de minha vontade justamente por acreditar que é de lá – na própria consciência que impulsiona o amor a ser eterno – que as fontes de nossa existência se acomodam.

Você sabe o que é portabilidade?


A Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) informa que, a partir de 01/09, iniciará a implantação da portabilidade no País.

A portabilidade numérica vai tornar o usuário “dono” de seu número de telefone fixo e celular. Assim, o usuário poderá mudar de operadora móvel e fixa sempre que quiser e manterá sempre o mesmo número. A portabilidade vale dentro de algumas regras específicas. Por exemplo, o usuário deve se manter no mesmo DDD para conservar o mesmo número. Mudanças de operadora, no entanto, estarão sujeiras a cobranças de taxas de instalação.

A Anatel definiu março de 2009 como data limite para implementar a portabilidade numérica em todo o país. Para Rio de Janeiro e São Paulo, por exemplo, as regras só vigerão a partir do início (RJ) e no fim de fevereiro (SP), respectivamente.

domingo, 24 de agosto de 2008

Notas de uma manhã de domingo


Nota 1 – Clariceando com a manhã: "Não é que vivo em eterna mutação, com novas adaptações a meu renovado viver e nunca chego ao fim de cada um dos modos de existir. Vivo de esboços não acabados e vacilantes. Mas equilibro-me como posso, entre mim e eu, entre mim e os homens, entre mim e Deus." (Clarice Lispector)

Nota 2 – Prata da casa: Sofri, mas tive que controlar meus gritos porque madrugada barulhenta pode gerar incômodos para os vizinhos. A seleção masculina de vôlei lutou, mas não teve como vencer as excelentes jogadas dos americanos. Destaque para Ball, o levantador dos Estados Unidos, e Marcelinho do Brasil. Após a conquista do Mundial, pena não ter conquistado o ouro olímpico. Coisas do esporte. Hora de recomeçar porque eu acredito!

Nota 3 – Agora é Londres 2012: tudo é um reinício. Bom pensarmos a partir daí. Como diria meu raiozinho de luz, Beijim Beijim!

Nota 4 – Registro de presente: Cartinha de mi madrezita lá de Belo Horizonte enviada por sedex. Como me fez bem! Sei que irás ler, lindona!

Nota 5 – Caio no Rio: Alexandre Araújo, por e-mail, me avisa sobre próxima palestra do Caio aqui no Rio de Janeiro. Domingo próximo, 31/08, pela manhã, na rua Silva Jardim, 23, Centro. Pra não ficar do lado de fora, como na última vez em que esteve aqui, lá no auditório do Colégio Shepard, o jeito é chegar bem cedo. Valeu pelo aviso!

Nota 6 – Sou eu mesmo na fotinha junto à xícara de café com leite. Thanks.

sábado, 23 de agosto de 2008

História das escolhas do coração


Depois de enfrentar nos tribunais, pela manhã, os advogados do ABN Real e da Petrobrás, à tarde atendi a vários clientes no escritório da ONG. Um deles, lá pelas tantas, me procurou. Tudo bem, já se tornou amigo e é em razão deste fato que salientou algo que me deixou bastante reflexivo com os caminhos que os muito gostares da alma humana percorre. Disse-me, em relação a uma terceira pessoa: “Não faço questão que goste de mim, desde que esteja comigo. O importante é que eu sei que amo.”

Existem vários amores e vários “gostares” como coloquei. A cada afeto, uma escolha diferenciada. Assim é a diversidade humana. Assim é a complexa alma humana. Sabemos, no entanto, que, independentemente de qualquer coisa ou pessoa, há um gostar – podemos dizer “amar” – que deve nos acompanhar do início ao fim, o amor próprio. Quem não se ama por inteiro, penso, não sabe o que é amar de fato. A primeira decisão a tomar é, portanto, identificar que o nosso primeiro amor é o próprio. Será que falei algo escalafobético? Não, estou certo que não; tanto que para muitos já se tornou frase de pára-choque. Amor próprio. Mas tudo isso que penso, penso sem estabelecer ajuizamentos em relação a quem quer que seja.

Numa relação, amar e ser amado é a resposta natural que obtemos durante a caminhada a dois. Quando não há correspondência é porque não temos uma relação, mas um só amor que pensa amar enquanto adoece porque pobre de afeto, porque não quer enxergar, porque se acostuma com o não-ter (mesmo estando fisicamente presente ao lado de alguém). Todas essas reflexões me povoaram a mente enquanto observava meu amigo se entregando à companhia das lágrimas. Após o silêncio respeitoso, falei-lhe algumas coisas não menos respeitosas porém carregadas da verdade que só amigos dizem quando todos parecem apenas querer agradar. Falei-lhe de nossas escolhas. Falei-lhe dos sentimentos.

Por que relato o que acabei de dizer? Porque, assim como ele, não poucos amam se esquecendo de si mesmos. Amar sem esquecer-se de si é saudável, já ensina a psicologia. A droga toda é que, em se tratando de sentimentos, vale o dito da boca de Jeremias, profeta judeu de uma época muito remota e anterior à Cristo: “enganoso é o coração, mais do que todas as coisas, e desesperadamente corrupto; quem o conhecerá?”

História inédita: o ouro no vôlei


E o que dizer da vitória brasileira nesta manhã de sábado? Vamos ser justos. O Brasil mereceu a renhida vitória sobre a seleção feminina de vôlei dos Estados Unidos. Não que as americanas tivessem jogado mal, ao contrário (putz, que quarto set foi aquele?!). Mas tínhamos que exorcizar velhos males e finalmente conquistar o inédito ouro olímpico para a seleção de nossas gatas. Elas estão de parabéns. Nós todos, orgulhosos. Eu, além disso, quase fiquei rouco. Afinal de contas, não sei torcer no silêncio. Que me perdoem os seres mais equilibrados que eu.

Nota: a uma da manhã deste domingão a vez será a é de torcer pela seleção masculina. Se aprontei com a torcida pelas meninas, não queiram imaginar o que farei daqui a pouco com a rapaziada. Sofre quem fica perto de mim nessas horas. Calma, minha gente, nada de fanatismo. Mas doses cavalares de patriotismo não fazem mal. Ah, mas não fazem mesmo!

Mais história pra contar


O atletismo brasileiro também fez História na primeira medalha de ouro em competição individual feminina. Maurren Maggi, a nossa atleta saltadora, desbancou o favoritismo da russa Tatyana Lebedeva, que ficou com a prata. Maurren saltou 7,04 m em sua primeira tentativa. Suas principais rivais realmente sentiram a pressão. Lebedeva, que em seu primeiro salto tinha marcado 6,97m, sua melhor marca do ano, queimou os quatro saltos seguintes. Mesmo os 7,03 m na última tentativa não bastaram para passar a brasileira.



Não é história, mas pesquisa


A Fundação Oswaldo Cruz iniciou o cadastramento de 200 voluntários homossexuais que irão participar de uma pesquisa mundial para determinar se o medicamento comercializado com o nome de Truvada, já usado no coquetel antiaids, pode também prevenir a contaminação pelo HIV.

O Truvada foi escolhido por ser um medicamento seguro, com poucos efeitos colaterais e já foi usado por cerca de 150 mil pessoas. O comprimido será tomado um vez ao dia por metade dos voluntários. A outra metade irá tomar placebo.

Durante as 72 semanas da pesquisa, os voluntários serão examinados e farão exames mensalmente, além de responderem a um questionário anônimo sobre o seu comportamento sexual no período.

quinta-feira, 21 de agosto de 2008

Lispectoriando


Assim que saí do Tribunal de Justiça, resolvi dar um pulo até o Centro Cultural Banco do Brasil. Após conferir a mostra no 2º Festival do Folclore Brasileiro (amanhã, 22 de agosto, é o dia internacional do Folclore), passei pela Livraria da Travessa para catar alguma novidade de Clarice Lispector. Soube que a editora Rocco está relançando várias publicações dela com formatos muito bons para leitura, inclusive obras infantis.

Nada fora do cotidiano até o instante em que resolvemos, eu e ela, Fernandinha Torres, pegarmos a mesma obra para conferir. Ficamos minutos perdidos lendo e relendo o miolo dos livros, na busca de alguma coisa que nos chamasse a atenção. Evidentemente que ela, a atriz, e seu filhinho confortavelmente deitado no carrinho de bebê ao seu lado, despertaram a curiosidade dos que nos viam do lado de fora da vitrine na tarde de ontem. Vendo a hora, não pude demorar. Tinha um compromisso com um cliente. Acabei deixando-as por lá – tanto a atriz quanto a escritora. Qualquer dia a gente volta a se encontrar pra lispectoriar mais um pouquinho...

O jogo político I


É, o presidente Lula pensou, pensou, pensou, mas sabia desde sempre que não poderia fazer um gol contra no jogo político. Vetar um projeto com cunho social relevante como é o caso da ampliação da licença maternidade de quatro para seis meses poderia lhe custar caro. A solução encaminha-se para a sanção, mas a ampliação para seis meses ficará facultativa ao empregador privado. Claro, vantagens serão concedidas na declaração do imposto de renda para os que “aceitarem” ampliar o alcance do benefício para suas funcionárias.

Pela proposta, as empresas que aderirem à ampliação da licença-maternidade vão receber incentivos fiscais e o título de "Empresa Cidadã". A medida vale tanto para a iniciativa privada como também para o setor público federal, estadual e municipal. A medida deverá entrar em vigor apenas em 2010.

É um toma-lá-dá-cá no acerto do jogo político. As mães, com toda razão, levaram vantagem dessa vez!




O jogo político II


Não tiveram a mesma vantagem os casais homossexuais quando o que estava em jogo era o projeto de lei que disciplina e organiza o direito de adoção. A futura-quase-aceita “Lei Cléber Matos” (em homenagem ao filho do deputado João Matos, autor do projeto, que foi adotado e faleceu) não contemplou o alcance do direito aos casais estáveis homossexuais. Questão de harmonização com outras leis, disseram os líderes do PMDB e outros partidos que só assinaram o PL (projeto de lei) depois que os artigos que mencionavam a questão dos casais gays foram retirados.

"O tema não vai ser contemplado porque não houve consenso, mas ele vai tramitar como uma proposição em separado", disse Maria do Rosário (PT-RS), autora da proposta, que deve encontrar resistências: "A Casa nunca deliberou e espero que nunca venha a deliberar sobre o casamento homossexual", declarou, da tribuna, o deputado Miguel Martini (PHS-MG).

A polêmica levou o Palácio do Planalto a pedir aos líderes governistas na manhã de ontem que a votação da lei de adoção fosse adiada para o início de setembro. A solução encontrada para salvar os outros artigos foi retirar o dispositivo. A matéria ainda pode ser revista, embora com poucas chances de inverter-se o acordo político. O que não se pode rever, por se tratar de cláusula pétrea da Constituição, é a realidade de que “todos são iguais perante a lei”. Bom, ta lá escrito. Será que os parlamentares lêem a Carta Magna? Depende, diria meu amigo alter-ego. Cada caso é um caso. Depende se a leitura da Constituição não o impedirá de abarcar votos nos seus currais eleitorais...

quarta-feira, 20 de agosto de 2008

Ius maternus


O Congresso Nacional aprovou a ampliação da licença maternidade para seis meses (ao invés dos atuais quatro meses). Calminha lá. O projeto foi encaminhado para sanção ou veto do presidente Lula. Aí é que ta o xiz da questão: se sancionar o governo perde, segundo cálculos do ministro Mantega, R$800 milhões por ano. Se vetar, eis um risco político muito grave. As mamães (e os papais) não perdoarão Lula. Lembre-se que em terra de Abrantes cada cabeça é um voto!

A César o que é de César; a Deus o que é de Deus. Às mães o que podemos dar às mães (e ao bem-estar de seus filhos também)!


Nota: fotografia de Lu Lacerda, campeã do 23º concurso de fotografia Sony em 2007. “Maternidade”.


A-chocolatados


O que foi aquilo a que assistimos ontem na partida de futebol do Brasil? O comentarista do Sport Tv se referiu como uma "chocolatada" que levamos dos hermanitos argentinos. Porém, registre-se o que ouvi de um repórter. A questão não é perder, menos ainda perder para a Argentina. É perder se apequenando ante a Argentina. Apequenar-se.

Vou anotar pra anotar pra lembrar na hora certa de criticar, entre outras, a quase-futura-nova lei de imprensa, a aprovação automática nas escolas públicas (independente da nota que os alunos tirarem), a tentativa de imposição – à bala – do cultivo de arroz nas terras indígenas de Roraima (leia-se interesses agro-político-financeiros) e a necessidade da presença institucional das Forças Armadas nas eleições municipais do Rio de Janeiro.


terça-feira, 19 de agosto de 2008

Uma reflexão matinal para hoje


Nós somos o que cremos. E o normal é que se fale, se pense e se viva conforme se creia.

“Eu cri, por isso é que falei. Também nós cremos, por isto é que falamos”.

Tem gente que pensa que a qualidade do pensar é determinada pela inteligência. Mas não é assim. Inteligência apenas determina sistemas lógicos, mas não a qualidade do pensar.

Assim, pode-se ser um gênio e capaz de inventar coisas extraordinárias. Entretanto, ainda assim, ter uma qualidade de pensar insensata.

O que qualifica o pensar não é a inteligência, mas sim a sabedoria!

Ora, sabedoria nada tem a ver com inteligência, mas com gratidão amorosa e reverente para com Deus: o sentido da vida!

A qualidade do pensamento é diretamente vinculada à sua capacidade de ver a realidade e a ela atribuir significados e valores certos.

O sábio vê o mal e dele se esconde.

O insensato vê o mal e o interpreta como uma oportunidade.

Ambos viram e vêem o mal. Porém, sob a camada do ver, em cada um dos dois — sábio e insensato — existe um olhar que nada tem a ver com o fato da pessoa ser um gênio ou um burro.

Há muitos gênios insensatos e há muitos burros sensatos!

Dois homens vêem uma maravilha da criação. Um deles não se ama, não se vê como tendo significado em relação aos demais seres humanos, e também sem nenhuma vontade de a eles servir pelo amor, mas, talvez, apenas pela chance de ter poder — e olhará para a maravilha que diante dele está, e poderá pensar: “Veio do nada, do acaso, dos dês-sentido”. Afinal, quem verá sentido em qualquer coisa se não o vir antes em si mesmo e em sua própria existência?

Já o outro homem a tudo vê com amor grato e reverente, enxergando sentido até na morte, até na dor, até no até...; e, por isso, diz: “Que maravilha! Eu e ela somos filhos do mesmo amor!”

Ora, tal homem não viverá no mesmo mundo do outro observador da maravilha, mesmo que estejam perfilados vendo a mesma coisa estupenda!

Quando o salmo diz “na Tua luz vemos a luz”, afirma que existe o que vemos, mas que isto é determinado pelo como e mediante o que vemos tudo, até a própria luz.

Quando se diz que Jesus seria objeto de contradição, se afirma também a mesma coisa, pois, o mesmo Jesus, visto em amor, é o Salvador; porém, visto sem amor, é apenas uma miragem buscando ser real, mas sendo vencida pelas forças do mundo real.

Ora, se meu pensar é determinado pelo meu crer essencial, o qual se vincula ao meu ver-sentir com ou sem amor e gratidão a existência [a partir da minha própria] — então, é sensato afirmar que a qualidade do crer que designará a qualidade do pensar, é equivalente ao vinculo que o crer tenha ao amar; pois, sem amor, não existe sensatez em nenhum olhar para si mesmo e para a existência.

A tentação do gênio, do filosofo, do cientista ou do vaidoso intelectual, é sucumbir à falácia de pensar que se pensa com o pensamento, esquecidos de que se pensa essencialmente com o coração, até quando alguém nega ter um.

Não existe razão pura entre os homens, mas apenas certa pureza de amor que qualifica certa pureza de pensar.

E tanto mais quanto o ver-pensar essencial seja definido pela fé que atua pelo amor, tanto mais limpo em sensatez será o olhar humano — seja o do gênio ou até mesmo o do burro.

Pense nisso!


Extraído de “Gênios insensatos e burros sábios”. Caio Fábio. 2008.

Shelter e suas lições “anti-armarianas”


Ontem, depois de uma tarde inteira em treinamento com os novos mesários e a equipe do Tribunal, ainda consegui tempo para estudar um processo na casa de uma amiga. Saindo de lá, para minha surpresa, sou procurado por um dos muitos “sobrinhos emprestados” (amigos dos sobrinhos) para receber de presente o filme “Shelter”, que já conhecia (inclusive com post aqui no Farelos), porém sem ter assistido até o fim na ocasião. Dessa vez, movido pela gratidão do gesto, resolvi assisti-lo pela madrugada enquanto pensava num conto que tô produzindo.

Em que pese a cultura enlatadinha norte-americana, tem lá seus efeitos reflexivos sobre o pensar “armariano” de alguns, ao qual respeito, porém, nos leva à consideração de seus efeitos na busca da felicidade duradoura para o ser. Afinal de contas, vale à pena sacrificar a felicidade de ser-se em detrimento dos padrões estabelecidamente impostos pela cultura moral? É uma das reflexões que os de olhos aguçados poderão identificar ao assistir Shelter.

segunda-feira, 18 de agosto de 2008

Dia de treinamento no TRE

Para muitos, a maioria dos eleitores, eleições acontecem apenas em outubro (no caso de primeiro turno). Certo que em outubro teremos a oportunidade oferecida pela democracia para realizarmos o exercício de nosso direito de escolha por meio do voto (consciente, fique bem claro!). Para uma minoria dos eleitores, no entanto, eleições começaram desde maio. É que os convocados para trabalhar nas eleições participam não apenas de convocação mas entrevistas e treinamentos. As duas primeiras etapas já ocorreram. Hoje, mais uma delas: o treinamento para cada função.

Meu papel é supervisionar o serviço e a desenvoltura de cada presidente, mesário e secretário. Pois bem, daqui a menos de três horas estarei com dezenas de convocados para mais um treinamento. A cada eleição, a cada turma para treinamento, como gosto de trocar experiências! Essa é a arte de educar – a troca –, conforme lição do mestre Paulo Freire. Não preciso dizer para além das palavras como é prazeroso pra mim, será que preciso?


Dia de homenagem I


Em agosto de 2006 nasceu publicamente na cidade do Rio de Janeiro uma Comunidade de fé cristã inclusiva e reformada para a comunidade LGBT. Betel, palavra hebraica que significa “Casa de Deus”. Como diz meu amigo Márcio Retamero, “pregando contra a opressão e a tirania dos religiosos, reafirmando, categoricamente, que Deus não faz acepção de pessoas. Mesmo!”

Ontem, no festejo de seu segundo niver, presenças ilustres de teólogos, um padre, Rev. João Valença, Cláudio Nascimento (coordenador de políticas públicas para a comunidade LGBT da Secretaria de Assistência Social do governo do Estado), coral da Igreja Presbiteriana da Praia de Botafogo e muitos outros representantes de diversas categorias. Foi prazeroso estar entre gente extremamente consciente de seu papel cívico, ouvindo experiências que me emocionaram e criando muitos vínculos com novos amigos.

Parabéns pelo transcurso dos dois anos!

Dia de homenagem II


Apesar da distância geográfica que nos separa, Madrezita, meu coração tem salas confortáveis para sempre lembrar de ti. Não como meras saudades, mas como bons sentimentos, aqueles mais filiais, imagináveis e possíveis. A justa homenagem não é pelo seu dia (ou por qualquer outro que venhamos convencionar como seu), mas pelo dia de saber ser você, Madrezita. Isso é o que importa! Sei que você entenderá - e sentirá - o que quis dizer por estas linhas em Farelos & Sílabas.

Sou uma canção de ninar!
Experimentadora dos sabores do tempo...
Estrela da constelação familiar.

Sou feita com a síntese
do segredo de amar!
Tenho duas fases: minguante e cheia,
assim como o luar!

Ivone Boechat

sábado, 16 de agosto de 2008

Primeiro ouro olímpico na História da natação brasileira


"Comece por fazer o que é necessário, depois faça o que é possível e em breve estará fazendo o que é impossível"
S. Francisco de Assis

Quando César Cielo conquistou a medalha de bronze nos 100 m livre, na quarta-feira, e disse que iria trazer também a medalha de ouro, poucos acreditaram no que o nadador falava. Nesta sexta-feira, ele cumpriu a promessa. Com 21s30, a apenas dois centésimos do recorde mundial, o brasileiro quebrou novamente a marca olímpica da prova e conquistou o primeiro ouro do Brasil em Pequim.

"É difícil, os 50 m são sempre difíceis. Com nadadores como esse ao lado nunca se sabe. No fim, tudo deu certo", celebrou o brasileiro.

Com a medalha de ouro dos 50 m livre, conquistada nesta noite (manhã de sábado em Pequim), ele se torna o primeiro brasileiro campeão olímpico da natação. Antes dele, as principais glórias nas piscinas eram de prata, duas com Gustavo Borges (100 m livre em Barcelona-1992 e 200 m livre em Atlanta-1996) e uma com Ricardo Prado (400 m medley em Los Angeles-1984).

O outro e o amor


“O amor discerne o limite do outro,
por essa razão o amor não é jactante e sabe esperar”
(C. Fábio)

sexta-feira, 15 de agosto de 2008

O momento chamado agora


Este é o momento de cada um; aliás, este deveria ser o momento de todos. Acontece que nem sempre fazemos do presente a nossa melhor escolha. O muito pensar quase sempre arrefece o olhar para o instante chamado “agora”. Quando se dá conta, foi-se. Indo-se, o que resta? Qualquer momento, exceto aquele que foi sem que tivéssemos dele aproveitado o instante. Assim é a vida. Assim é que se colore os dias: aproveitando-se o momento chamado agora. Quem é sábio, aproveita e cresce na mesma intensidade das cores do presente. Quem não for, mesmo achando que é, deixa passar. O “depois” não carrega a mesma intensidade do “agora”, então, que proveito há?

Tudo é uma questão de de-cisão. Há um corte a ser feito. Todos nós podemos decidir aproveitar ou não o momento chamado agora. Todos nós podemos decidir pela ruptura com o que já se foi e não se perder nos devaneios que distraem para outros momentos, exceto para aquele que ainda depende de nós: o presente. Assim, mesmo que passando pelas fases mais sombrias ou ainda se sentindo incolor diante de tanta pressão sentida, há que se decidir pela certeza que ainda depende de nós. E ao decidir-se, lembrar que, por menor que seja minha contribuição, o “agora” nunca mais será o mesmo quando nele interferir com minhas decisões.

Dedico a uma amiga com quem acabei de conversar ao telefone e que muito me enriqueceu nos poucos porém suficientes momentos no chamado presente. O dia está radiante, nem tanto pelo sol que se enraíza com seus raios na manhã, mas muito mais pelas cores que percebo no instante. Como disse minha amiga, a simplicidade do agora é que são as cores mais intensas as quais poucos conseguem captar...

Tem os que passam...


tem os que passam
e tudo se passa
com passos já passados

tem os que partem
da pedra ao vidro
deixam tudo partido

e tem, ainda bem,
os que deixam
a vaga impressão
de ter ficado


(Alice Ruiz, in Vice Versos. Ed. Brasiliense – Prêmio Jabuti de poesia em 1989)

quinta-feira, 14 de agosto de 2008

Os quereres e os pensares na palestra da senadora


Final de semana passado estive envolvido na X Conferência Estadual dos Advogados do Rio de Janeiro. No penúltimo dia do encontro, alguns prazeres me encheram o peito de ânimo. Pude participar de alguns fóruns e debates cercado de gente que, de alguma forma, contribuiu para nossa História. Senti-me privilegiado pelos saberes que me foram compartilhados em vários temas de extrema relevância. Saúde pública e SUS. Segurança pública e forças armadas. Narcotráfico e currais eleitorais. Meio ambiente e sustentabilidade. Pois bem, neste último conheci um ser humano cativante pela força e coerência de sua simplicidade observadora. Falo da ex-ministra do meio-ambiente e atual senadora pelo estado do Acre, Marina Silva.

Durante as duas horas de debates com especialistas na área do direito ambiental, não tive como não me emocionar (ou melhor, não teve quem não se emocionasse) com a fala da senadora. Não apenas pelo seu histórico de luta e perseverança, posto que alfabetizada na adolescência, mas pela concateneidade de suas idéias ao buscar o progresso sem com isso irromper no desmando à nossa Constituição. Afinal, ela mesma assegura que a vida humana é um bem e que a promoção do bem de todos constitui um dos objetivos da nação. Tocamos no aspecto nevrálgico: os índios, os caboclos e as populações ribeirinhas com sua cultura, costumes e tradições. Mais ainda, os direitos constitucionais assegurados às terras indígenas sobre as quais a União deve “demarcar, proteger e fazer respeitar todos os seus bens” (art. 231 da Constituição). E inobstante a isso, declara-se que “é vedada a remoção dos grupos indígenas de suas terras” (§ 5º do art. 231 de nossa Constituição).

O grande problema que enfrentamos é que nossos saberes e pensares, que representam a diversidade que nos forma como nação, nem sempre convergem para aquilo que é bom para todos, e não apenas para o serviço de algum interesse. "Precisamos aprender com a sabedoria do próximo, desfazendo-nos da falsa premissa que somente a nossa é a mais importante, a que deve prevalecer", dizia ela. "Os caboclos, os kayapós, os tikunas, os yanomamis, os saterés podem não ter o conhecimento acerca dos nossos saberes, mas eles vêem e observam, ouvem e discernem, entendem e sabem o que lhes é bom ou não, importante ou não, e eles não podem ter seus saberes desprezados" – completou.

Falar de preservação ambiental virou moda hoje em dia, mas “quem sabe, faz a hora, não espera acontecer.” “É mais fácil defendermos o que está longe de nós”, dizia ela. “É mais fácil se mostrar interessado com a preservação da Amazônia do que com o Rio Tietê ou com a Baía de Guanabara. E por quê?” – perguntou-nos. “Porque o que tá perto de nós dá trabalho”. Imediatamente me lembrei de uma palavra de São João quando dizia: “Se alguém disser: Amo a Deus, e odiar a seu irmão, é mentiroso; pois aquele que não ama a seu irmão, a quem vê, não pode amar a Deus, a quem não vê”. E qual a relação entre um e outro? Simples sem ser simplista. É mais fácil dizer que ama a Deus a ter que engolir a realidade da diversidade a qual muitos não amam e sequer cogitam na possibilidade de amar de fato. Sim, é mais elegante pronunciar o pai-nosso a ter que encarar o “assim como” da oração na própria pele. Amar a Deus é fácil, difícil é ter que se importar com quem está pelas esquinas do meu bairro. Amor ao estilo “laissez faire”. “Laissez faire”. Emocionado que estava, ainda me deliciei na sabedoria da parábola do caboclo e dos formigueiros contada pela senadora. Numa outra oportunidade contarei. Por ora, a certeza que só somos qualquer coisa se considerarmos a certeza do próximo, seja ele quem for, sendo também perto de nós. Discretamente enxuguei as lágrimas em meio aos aplausos demorados dos meus colegas. Toda vez que vejo beija-flores carregando água em meio à grandeza da floresta em chamas, me emociono. Naquele mesmo dia ainda teríamos um outro fórum com o ministro da Defesa, Nelson Jobim.

Árvores, raízes e rodas


Estive nestes dias com uma amiga no teatro. O bom de estar com ela é a riqueza de sua companhia. Mas não apenas a riqueza da presença, mas a presença da riqueza nela. Nada do que fale ou pense lhe soa estranho ou causa-lhe interpretação vária. Ela sempre sabe me compreender. A leveza do papo é constante porque não preciso usar das escusas para tentar explicar qualquer coisa que não tenha sido discernida no espírito daquilo a que me propus. É tão difícil encontrar pessoas sensíveis ao entendimento do outro. Falo por experiência própria. Entretanto, sei que todos somos diferentes. E há riqueza nessa dimensão diversificada dos seres com os quais lidamos nas nossas relações, sejam familiares, profissionais ou simplesmente entre amigos.

Já na fila para entrarmos no teatro, de braços dados comigo, dizia: “sou o que sou e a isto batizo de felicidade por me encontrar inteira. Isso só incomoda a um grupo, o da maioria, que não gosta muito de ver gente inteira e feliz. Mas o que é a maioria? E eu, o que tenho a ver com o que pensa a maioria?”. Ouvi-a com atenção desmedida porque digeria cada palavra como um sinal de clarividência para o meu momento. Segundos se passaram e as últimas palavras ainda eram pronunciadas quando ela simplesmente gargalhou. “O que importa a maioria?” – repetiu olhando com brilho intenso na minha direção. Sorri. Aliás, os muitos anônimos da fila também sorriram. Ela tinha se tornado um “ato” à parte naquela noite. O melhor estava para o fim do espetáculo. Sentados num banco de praça, em frente ao Teatro Carlos Gomes, comentava sobre a peça quando ela me interrompe para falar das raízes das árvores. Havia muitas árvores centenárias ao nosso redor. Dali, em meio ao caminhar das horas naquela noite, divagamos sobre o enraizamento do ser humano que se reconhece sendo quem é. E mesmo sendo quem é não lança para ninguém as responsabilidades de ser como é e quem é. E quem é o que é sem grilos pra si, concluímos, é como uma árvore bem plantada e enraizada nas suas certezas que lhe trazem, no tempo devido, a pacificação consigo mesmo e com a própria existência.

A nossa viagem, por assim dizer, alcançou tempos é épocas que passamos a recordar juntos naquele banco de praça. Bem ali, acreditem, há sete anos atrás, lembramos do trabalho social que desenvolvemos com outros amigos queridos. Chamava-se “Madrugada do Carinho”. Por quatro anos benfazejos fui o presidente daquilo que assumiu ares de ONG. Chamava-se “APÁS”, pronunciando em oxítona para marcar bem o propósito de nossas intenções. Distribuíamos alimento, roupas e brinquedos para as populações de rua. Tive o privilégio de presidir por quatro anos aquele trabalho. Trocamos várias figurinhas. Parecia que movíamos uma roda de lembranças, quase todas com nomes e características próprias.

A vida é uma roda. A peça foi apenas um pretexto para trocarmos muitas idéias. “Estamos vivos, meu amigo”, profeticamente me disse como se estivesse cobrando uma reação diferente de mim. Não podia. Taciturno, o instante me pedia silenciosamente apenas a contemplação. Sim, estamos vivos. E enraizados naquilo que amamos. Concluí.

terça-feira, 5 de agosto de 2008

El Niño, La Niña e La Alienación


Ultimamente meus posts caminham sobre o tema “amor”, mas, de vez em quando, é bom variar. A época é farta do ponto de vista das possibilidades de reflexão ante o que vivemos. Estamos em ano eleitoral, exceto, talvez para o Distrito Federal. Muita gente surge com idéias extraordinariamente solucionadoras. O simplismo se faz presente em muitos discursos. Resolver-se inúmeros problemas é questão de voto, qualquer voto, pensam alguns. E todos sabemos que não é qualquer voto. É o seu e o meu voto também!

Pesquisa do TSE demonstrou que o interesse do eleitorado compreendido na faixa etária dos 16-18 anos diminuiu drasticamente. Aliás, de 2006 pra cá houve queda no número de jovens eleitores (dos 16 aos 18 anos). Poucos querem se envolver. Poucos querem compromisso.

A palavra compromisso foi pipocada anteontem por um amigo como a antítese para a alienação. Estava na palestra dele (tal como ele esteve na minha, na terça-feira passada). Falei sobre “Alienação comunitária” e ele sobre possíveis respostas para as alienações dentro de um mesmo congresso do qual participamos como convidados. Quem se compromete, age, resumiu. Não teve como não lembrar dos versos de Geraldo Vandré na revolucionária letra de Pra não dizer que não falei das flores: “quem sabe faz a hora, não espera acontecer.”

Faz a sua parte todo aquele que sabe que deve. Não aguarda passivamente que aconteça. Alienados, portanto, são os que cruzam os braços numa aceitação mórbida do auto-anestesiamento. O mundo ta abarrotado desses “fenômenos”.

A alienação é mil vezes pior que os estragos provocados pelos tornados, vendavais e outros fenômenos meteorológicos que acabam afetando a vida de todo planeta. A alienação arrasa tudo por dentro de nós. Desestimula o pensamento, o que impede o nascedouro da conscientização. Acaba com a possibilidade de reação, pois sem consciência do que rola pelo nosso mundo (tanto na visão macro quanto na visão micro), tudo fica sem explicação e prossegue num ritmo muito bom pra quem vive como elite.

Será que muitos se dão conta desse mal? Isso é algo que me preocupa. A gente pensa em tanta coisa. Esquecemos tantas outras. Será que nos damos conta que a alienação, seja em que nível ou em relação ao que for, sempre será um entrave aos nossos exercícios mais prazerosos de reflexão e ação?

Tal como os meteorologistas, que prevêem a aparição dos sinais que eclodem em tempestades, tornados ou mesmo na aproximação de frentes frias, geadas e etc, nosso papel a cumprir é o de estímulo à conscientização da cidadania. Cidadãos conscientes são avessos à alienação. Vivem certos de que podem e devem desempenhar bem o papel de cidadãos, fazendo dos deveres sua parcela de contribuição para melhorar o mundo, mas também transformando seus direitos no exercício livre e democrático de quem sabe e, porque sabe, faz a hora, não espera por acontecer. Cidadãos comprometidos são beija-flores nas florestas em chamas, são profetas urbanóides em tempos de muitos mandos e desmandos, e são também seres humanos como quaisquer outros, exceto pelo fato de prestarem bastante atenção nas mudanças climáticas. Este ano é um ano de múltiplas variações do clima político e social. Se vai chover ou fazer sol depende mais de nosso compromisso do que da natureza em si. Mas o tempo ainda trará dias mais claros. Outubro é daqui a dois meses. Vamos aguardar as previsões e fazer a nossa parte nos nossos versos!

“Bent”: eu te vi!


BENT foi premiada como melhor peça em todos os países em que foi encenada; na Broadway foi interpretada por Richard Gere, em Londres por Ian McKellen e na primeira versão brasileira, do início dos anos 80, por José Mayer.

Para o diretor Luiz Furlanetto, BENT é um espetáculo atual, pois mostra temas como a segregação e o preconceito. “A peça é um pequeno grito de alerta, um SOS, uma oportunidade para de novo refletirmos sobre a importância das desigualdades e das diferenças, sejam pelo credo, raça ou preferências sexuais”, foi o que afirmou.

O diretor também conta que nesses 60 anos que se passaram após o final da Segunda Guerra Mundial, muito se falou e se filmou a respeito do que os nazistas fizeram, em particular ao povo judeu, mas pouco ou quase nada se disse a respeito de um pequeno grupo que, segundo depoimentos, eram mais odiados que os próprios judeus, os homossexuais. Uma explicação de Furlanetto que considerei interessante foi quando disse que “eles (os gays na Alemanha nazista) foram submetidos a todos os tipos de torturas físicas e psicológicas e, mesmo após o término da guerra, não foram reconhecidos na Alemanha como cidadãos até 1969”.

A palavra bent pode significar pendor ou interesse por determinada habilidade artística. Porém, é mais conhecida como um termo pejorativo para designar homossexuais. A perseguição dos nazistas aos homossexuais e o cotidiano sub-humano que enfrentaram nos campos de concentração é o mote da peça BENT, de Martin Sherman, escrita em 1979. Sucesso de público e crítica, o texto ganha uma nova montagem com direção de Luiz Furlanetto – prêmio Shell de melhor diretor pelo espetáculo por Trainspotting. O elenco conta com os atores Augusto Zacchi e Gustavo Rodrigues (que também atuaram nos espetáculos Trainspotting e Laranja Mecânica), além de Rodrigo Pandolfo, Miro Marques, Frederico Lessa, Allan Souza Lima e do cantor Breno Pessurno.

A ação começa no ano de 1934, contextualizando-se em uma época de grande efervescência cultural na Alemanha, associada ao ambiente libertário dos cabarés, então em voga. Nesse período, intelectuais, artistas e outros freqüentadores da noite berlinense, sob influência dos movimentos de vanguarda modernista, parecem ainda alheios às transformações políticas que ocorrem na Alemanha. O espetáculo segue narrando o então início da perseguição nazista e a crueldade praticada contra judeus e homossexuais nos campos de concentração, através da trajetória do personagem Max (Augusto Zacchi).

Ao tentar fugir de Berlim, Max é capturado e enviado para um campo de concentração, não como homossexual e sim como judeu; lá conhece Horst (Gustavo Rodrigues), preso por assinar um manifesto em favor dos direitos homossexuais, com quem vive uma inesperada e secreta história de amor.

No Rio, em cartaz com preços populares no Teatro João Caetano até o dia 15 de agosto. Às 19h, de quinta a domingo.

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